Ariane Feijó

O marketing não existe mais. Longa vida ao marketing.

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“Até 2030, o marketing não vai mais existir”. A frase circulou em uma roda de executivos de marketing recentemente, a partir de uma pesquisa da Ogilvy com especialistas em tendências de mercado. Ela soa inicialmente como uma profecia apocalíptica. Mas, ao observar de perto a transformação que está em curso nas empresas mais competitivas do mundo, incluindo algumas startups, ela ganha contorno de realidade. O marketing tradicional — entendido como departamento isolado, focado em campanhas, reputação institucional ou entregas criativas — está perdendo espaço para algo mais abrangente, estruturado e, como eu gosto de chamar, sincronizado: um sistema transversal de crescimento, construído com dados, tecnologia, conteúdo e propósito.

O marketing não acabou. Mas parece estar se dissolvendo nas engrenagens do negócio. (Finalmente.)

O fim do marketing ornamental

O que está desaparecendo é o marketing decorativo. Aquele que fazia sentido em um mundo de baixa mensuração e alta dependência de campanhas. Que operava isoladamente, desconectado das decisões de negócio, centrado apenas em visibilidade, mas sem responder por impacto real. 

Isso não significa o fim do branding ou do brand awareness, muito menos no B2B, onde a construção de marca é um dos ativos mais poderosos. A mudança está na forma como essas frentes se integram. O novo marketing não separa “marca” de “performance” como se fossem opostos: ele conecta reputação e resultado num mesmo sistema.

A discussão de escolher entre um ou outro fica, agora, no passado. É sobre criar um modelo em que a força da marca acelere a performance  e onde cada ação de performance retroalimente a reputação construída.

Esse modelo já não se sustenta. Não em um cenário onde os orçamentos são cada vez mais desafiados a provar resultado, e onde a diferença entre uma marca memorável e uma irrelevante passa pela sua capacidade de gerar valor tangível, com consistência e eficiência.

A desconexão entre marketing e vendas, a fragmentação entre campanhas e jornada de compra, e a dificuldade de provar impacto são sintomas de um modelo esgotado.

O novo marketing está menos preocupado com campanhas e mais interessado em criar sistemas de aquisição previsíveis, com foco em dados, autoridade e sincronização real com o negócio. Ele parte de conversas reais e significativas. Ele deixa de ser uma “caixa-preta criativa” para se tornar um eixo estratégico, que conecta reputação, produto, vendas e performance.

Acompanho essa transição com empresas B2B que antes nos procuravam para “fazer campanhas” e hoje exigem estruturas mais sofisticadas: com SEO técnico, funis conectados, social selling com IA, e sistemas de atribuição que comprovam o impacto do marketing no faturamento.

Via de regra, quem ainda nos pede “campanhas” são empresas com baixa maturidade digital — ou clientes de agências que, apesar de uma estética moderna, seguem operando sob uma lógica centrada na entrega criativa e não no impacto estratégico. Mesmo agências ditas inovadoras ainda funcionam dentro do ciclo do “próximo criativo”, sem conexão direta com o negócio. Muitas vezes, substituem funcionários por GPTs sem entender de fato a lógica da orquestração que a IA pode contribuir tanto.

Como parceira dessas agências e seus clientes, ajudo a construir pontes entre comunicação e resultado. Em muitos casos, essa evolução leva a revisões profundas nos modelos de contrato. Não por conflito, mas porque, uma vez que o cliente aprende a medir impacto, ele passa a questionar tudo o que não gera valor.

Vendas, produto e marketing: o novo triângulo de poder

A fronteira entre marketing, vendas e produto nunca foi tão fluida. Quando o marketing participa da concepção de produto, ele traz ao mercado soluções com aderência real. Quando colabora com vendas, encurta ciclos e melhora a taxa de conversão. Quando orienta a estratégia, posiciona a marca como protagonista e não coadjuvante.

Nesse novo modelo, o marketing deixa de ser “o time das ideias” e se torna engenharia de crescimento. Isso exige novos perfis, novas ferramentas e uma nova mentalidade: menos vaidade, mais accountability. Menos execução reativa, mais orquestração inteligente.

A emergência da IA generativa, dos dados em tempo real e dos algoritmos de atribuição não está matando o marketing. Ela está matando o improviso.

Ferramentas de IA ajudam a acelerar testes, automatizar insights e escalar abordagens. Mas o marketing do futuro continua precisando de algo essencial: visão crítica, sensibilidade humana e alinhamento estratégico. A tecnologia não substitui o pensamento. Ela elimina desperdícios.

O caminho é incorporar IA em todo o processo: desde a redação de conteúdo até a estruturação de fluxos de qualificação. Não para fazer “mais rápido”, mas para fazer melhor. Mais inteligente. Mais orientado ao que realmente importa: impacto.

Uma nova cultura de marketing: transversal, viva, orientada a resultados

Em vez de pensar em “ter uma área de marketing”, as empresas que crescem sustentavelmente estão se tornando organizações com cultura de marketing. Onde cada decisão de produto, serviço, vendas e experiência leva em conta o cliente, a comunicação e o posicionamento.

Essa cultura exige novas formas de organização interna, novas métricas (além do CAC e do ROI) e uma liderança que veja o marketing não como um centro de custos, mas como motor de reputação, diferenciação e crescimento.

O marketing, como conceito isolado, talvez realmente deixe de existir nos próximos anos. Ele será absorvido por estruturas maiores, como growth, go-to-market, business design ou orquestração de reputação.

Mas sua essência seguirá mais viva do que nunca: comunicar valor, atrair interesse, posicionar marcas e mover mercados. Só que agora com mais método, mais inteligência e mais resultado.

O marketing não morreu. Ele apenas saiu do centro do palco e foi para os bastidores onde a estratégia real acontece.

Longa vida ao marketing.