Marcella Oliveira

Marcas de luxo: a proximidade com o público é o futuro ou a perda da exclusividade?

De cafés sofisticados a beach clubs e eventos imersivos, as marcas de luxo estão criando novas experiências para se conectar com seu público, mantendo o equilíbrio entre acessibilidade e sofisticação

O mercado de luxo sempre foi sinônimo de exclusividade, e é justamente essa aura de inacessibilidade que cria seu poder de atração. Marcas de alto padrão construíram, ao longo de décadas, um imaginário que as coloca como símbolos de distinção. O alto luxo, por definição, apela para a escassez e o desejo de pertencimento a um seleto grupo. Este apelo à exclusividade é fundamental para a construção do valor percebido, um valor que transcende o produto em si e se reflete em uma sensação de privilégio único.

À medida que o mercado evolui, vemos um movimento sutil, mas significativo, das grandes maisons em direção à aproximação com o público. Podemos até dizer que a entrada em produtos de beleza, por exemplo, é uma forma de permitir que quem não pode pagar R$ 50 mil em uma bolsa, pode comprar um batom. É aqui que entra a complexa dança entre manter raridade e criar novas formas de engajamento sem comprometer o posicionamento da marca.

Loja específica de produtos de beleza da Chanel. Foto: Reprodução/Instagram

E essa transição não significa uma diluição da exclusividade, mas uma reinterpretação do conceito de luxo, que se adapta às exigências do consumidor moderno. Em 2009, em  minha primeira visita a Paris, fiquei na longa fila na Louis Vuitton da Champs-Élysées. Embora tenha saído sem adquirir nenhum produto, a sensação de entrar naquele universo me marcou profundamente. 

Fachada da icônica loja da Louis Vuitton, em Paris. Foto: Reprodução/Unsplash

Ao longo dos anos, acompanhei o desenvolvimento das marcas de luxo e o que se observa é uma crescente tentativa de aproximar-se, de abrir as portas sem perder a essência da marca. O luxo digitalizado tem permitido uma nova proximidade, mas é o offline que ainda mantém a chama do pertencimento aceso.

Um exemplo que vivenciei foi um evento promovido pela Tiffany & Co. na Pinacoteca de São Paulo. Em vez de se restringir a uma loja, a marca transformou-se quase em uma obra de arte dentro de um espaço cultural. Essa estratégia reflete um movimento claro das marcas de luxo: aproximar-se do público, mas sem deixar de lado sua essência de requinte e exclusividade. Afinal, quem já foi convidado para um jantar na Pinacoteca? Com certeza, poucos. 

A Tiffany & Co promoveu um almoço na Pinacoteca de São Paulo. Foto: Ale Virgílio

No caso da Moët & Chandon, o recente brunch no rooftop do hotel W durante um domingo comum para assistir uma corrida de Fórmula 1 foi outro exemplo de como o luxo está se renovando. Com a exposição de uma garrafa assinada por Ayrton Senna e o discurso de que foi com uma Moët & Chandon em mãos que se começou o tradicional gesto de estourar a champagne no pódio, a marca criou uma conexão emocional, não apenas com o produto, mas com a memória coletiva e o glamour da F1. A Moët queria celebrar o retorno como patrocinadora do GP (após um hiato de quase 15 anos), e celebrou, mas deu um jeito de também fortalecer os laços afetivos com a marca sem perder seu caráter premium.

A garrafa assinada por Ayrton Senna foi a atração do evento promovido pela Moët & Chandon em São Paulo. Foto: Divulgação

Essa abordagem foi perceptível no filme Sra. Harris Vai a Paris, que ilustra uma das grandes lições do marketing de luxo contemporâneo: a experiência do cliente não é mais um elemento periférico, mas o cerne da construção da marca. A Dior, tradicionalmente uma das marcas mais exclusivas do mundo, abre suas portas para uma cliente fora do perfil habitual: uma viúva sem condições financeiras de comprar um vestido, mas com esse sonho. A narrativa reforça o conceito de que, no luxo, a verdadeira exclusividade está em fazer o cliente se sentir especial, sem perder a essência do que faz a marca única.

O verão europeu também tem sido um ponto de inflexão para muitas marcas de luxo que buscam expandir seu território. Durante a temporada, várias maisons de alto luxo ocuparam locais icônicos à beira-mar, como a Dior e Dolce & Gabbana, que transformaram praias e clubes de verão em extensões de suas marcas.

Beach club ambientado pela Dolce & Gabbana em Capri. Foto: Reprodução

A união entre gastronomia e moda é outra ferramenta de aproximação para as marcas de luxo. Restaurantes e cafés assinados por grandes maisons têm se multiplicado ao redor do mundo. Exemplos como o Le Café V da Louis Vuitton em Tóquio, o Dior Café em Miami e Paris, e o Prada Caffè em Londres, são locais onde os consumidores vivenciam o luxo de uma forma mais cotidiana, sem, contudo, comprometer a sofisticação que essas marcas representam. 

Enquanto o digital permite que o luxo se torne mais visível, a fila que ainda se forma em frente às lojas da Louis Vuitton em Paris, e em outras mundo agora, é o reflexo de algo mais profundo: o desejo humano de estar diante do inacessível. Mesmo na era digital, a verdadeira essência do luxo ainda reside na experiência tangível, no toque, no cheiro, no momento de imersão que não pode ser replicado pela tela.

Bolinho da Louis Vuitton
Doce do café da Louis Vuitton em Tóquio. Foto: Reprodução

O mercado de luxo, em sua busca por relevância e acessibilidade, está em uma encruzilhada. O desafio será saber como se aproximar do novo público sem perder o que o torna desejado e único. Como a exclusividade será redefinida no futuro? Ao abrir portas, as marcas estarão apenas expandindo sua audiência ou diluindo o próprio conceito de luxo? Essa é a questão que ficará com as marcas, e também com os consumidores, nos próximos anos.

Agora, a grande pergunta é: será que a aproximação, por mais estratégica que seja, pode, de fato, comprometer a aura de exclusividade que torna o luxo tão irresistível? Uma reflexão que aguarda, no tempo, sua resposta.

Marcella Oliveira
Marcella Oliveira

Eventos de luxo

Marcella Oliveira é jornalista com especialização em Ciência Política, atua como editora-chefe da Revista GPS|Brasília, a principal publicação de lifestyle e mercado de luxo do Centro-Oeste. Transitando nos universos dos eventos de luxo, turismo, gastronomia, arte, arquitetura, moda e beleza, Marcella consolida seus conhecimentos sobre o mercado de luxo com a Comunicação Estratégica para marcas e seu posicionamento no mercado. Atenta aos detalhes e a tudo que remete ao universo da personalização, vive e compartilha suas experiências pelo Brasil e pelo mundo. Tem mais de 15 anos de experiência em comunicação 360º, marketing, eventos e mercado editorial, com passagem por grandes veículos de Brasília e empresas dos setores de marketing e tecnologia.

Marcella Oliveira é jornalista com especialização em Ciência Política, atua como editora-chefe da Revista GPS|Brasília, a principal publicação de lifestyle e mercado de luxo do Centro-Oeste. Transitando nos universos dos eventos de luxo, turismo, gastronomia, arte, arquitetura, moda e beleza, Marcella consolida seus conhecimentos sobre o mercado de luxo com a Comunicação Estratégica para marcas e seu posicionamento no mercado. Atenta aos detalhes e a tudo que remete ao universo da personalização, vive e compartilha suas experiências pelo Brasil e pelo mundo. Tem mais de 15 anos de experiência em comunicação 360º, marketing, eventos e mercado editorial, com passagem por grandes veículos de Brasília e empresas dos setores de marketing e tecnologia.