Experiência de Marca

O efeito bolha e nossa sobrevivência profissional

 Texto super atual, mas ainda atemporal. Feito pensando na live. Tem muito tema a discutir, conteúdo a transmitir.

Bem provavelmente eu não tenha vivido em minha vida um período com ideias tão polarizadas. Não só as minhas, mas a de todos. Um mundo de coxinhas contra petralhas, carros contra motos, canetas contra lápis, hambúrguer contra cachorro-quente. Vivemos num período em que estar em um lado bem definido parece ser cool, e se mostrar entendedor de todos os assuntos, tendo ou não informações quanto a eles, algo lindo e que nos coloca acima dos demais. Tento dia a dia não cair nesta armadilha e entender que este não é o caminho, e acho que estou me saindo bem.

A verdade é que vivemos numa grande bolha, tendo cada dia menos contato com o mundo plural que nos cerca. Os algoritmos das mídias sociais, criados para nos dar as informações que provavelmente queremos, ajudam a nos tornar pouco menos humanos. Nossa inteligência aos poucos vem se tornando tão artificial quanto a das próprias redes. Convivendo nas redes digitais com um círculo de contatos que pensa parecido a nós, tendemos a entender que o nosso mundo é o correto e que nossa opinião é a mais inteligente, afinal, recebemos centenas de curtidas por elas. Bobagem. Efeito bolha.

Nas últimas eleições à prefeitura de São Paulo me deparei com um fato interessante: um amigo que votaria em Haddad (PT) postou que este certamente ganharia as eleições, já que em sua timeline só via posts a favor deste candidato, e críticas aos demais. Ironicamente, semana seguinte outro colega postou algo bastante semelhante, mas agora a favor de Doria (PSDB). Quem estava certo? Certamente os dois, já que ambas timelines respeitavam o mesmo algoritmo, que apresentava a cada um deles um cenário político totalmente diferente, mas alinhado ao que costumam postar, curtir, comentar e compartilhar. Estavam cegos, mesmo enxergando. Estavam na bolha.

Se chegou até este ponto do artigo, deve estar imaginando o que os três parágrafos anteriores têm a ver com marketing, publicidade, live e varejo. Ora bolas… Tudo! Não somente quanto ao entendimento do funcionamento dos próprios algoritmos, que cada dia mais é fundamental ao profissional de comunicação, mas principalmente os efeitos destas bolhas e da bipolaridade que elas causam. Afinal, teoricamente, profissionais que atuam com o que fazemos deveriam ir à contramão delas, até mesmo por sobrevivência profissional.

Fomos formados para sermos sem preconceitos seja ao tema que fosse, e entendedores de tudo, mesmo que de forma superficial. Afinal, um dia iriamos atuar na comunicação de uma marca que se relaciona com o público A, e no outro dia com o Z. Se tivéssemos preconceitos que nos impedissem de entrar nos seus mundos, ou bolhas que nos impedissem que entendêssemos as informações que chegam a eles, nossa comunicação teria excesso de ruído, bem provavelmente causando efeito menor que o pretendido nas reuniões de briefing. Perderíamos a nossa fortaleza: a empatia. A missão do publicitário de enxergar o mundo através dos olhos dos outros.

O marketing pode se transformar, as ferramentas on e off line mudar completamente e os algoritmos ganhar espaço na comunicação, mas algo não mudará: a necessidade de entendermos o mundo do nosso cliente, do nosso consumidor e de todos os que influenciam no resultado dos nossos esforços de comunicação. Entender de gente continua e continuará sendo fundamental. O resto passará ou se transformará. Nada, em matéria de comunicação, continua igual por muito tempo. Só isso: a necessidade de entendermos de gente, de nos colocarmos no lugar dos outros.

É justamente nesta armadilha que estamos caindo, dia a dia. Antes de publicitários, somos pessoas. E como pessoas estamos entrando num mundo dipolar por conta de bolhas criadas por nós mesmos. Se isso já faz mal às pessoas, a um profissional que precisa se relacionar com elas, é quase um suicídio. Precisamos voltar a ser o que pede a teoria: os sem preconceito, os empáticos, os que se cobram diariamente a enxergar o mundo através dos outros dos consumidores dos nossos clientes.

Assim, de quebra, ainda conheceremos um mundo novo a cada projeto. Alguns deles, provavelmente, melhores que os nossos próprios.