Experiência de Marca

O resgate do croqui

Ao me ver trabalhando sozinho, isolado em plena quarentena forçada, fiz uma viagem no tempo, no “meu” tempo e nos tantos projetos que tive a chance de me ocupar.


O susto provocado pelo Coronavírus levou o mundo a fazer uma pausa. Uma pausa na correria, uma pausa nos eventos, uma pausa nos projetos… Mas a vida não foi pausada. Muito menos a criatividade. E com tempo “ocioso”, como muitos, procuro coisas para fazer, incansavelmente.

Ao me ver trabalhando sozinho, isolado em plena quarentena forçada, fiz uma viagem no tempo, no “meu” tempo e nos tantos projetos que tive a chance de me ocupar. E nessa busca por mim mesmo ao longo de toda uma vida criativa, dedicada a projetos tão diversos, tive o prazer em revisitar trabalhos que, por vários motivos, nunca saíram do papel.

Uma verdadeira “Volta dos que não foram”, um “resgate de croqui”.

Mas, sem tristeza alguma ou nostalgia! Porque os projetos que acabaram não vingando se tornam fonte de pesquisa, de aprendizado e de inspiração. 

Volta e meia gosto de olhar antigos croquis, pois eles me recordam o estudo e lições que cada desenvolvimento de projeto trouxe . E entendo que nada é permanente: assim como precisamos fazer essa pausa forçada para cuidar da saúde, rever nossos conceitos, focar em nós e nos que estão em volta, e definir novos rumos para uma vida melhor em sociedade, precisamos de vez em quando parar para observar os caminhos que estamos seguindo.

Ao parar e pensar, a gente observa. E, ao observar, a gente percebe esse lapso.

Observei que os meus colegas de profissão, sobretudo os mais jovens, desenham cada vez menos. O que acho uma pena, já que o trabalho criativo do arquiteto requer, necessariamente, o ato de desenhar.

Ao deixar o papel de lado, priorizando tecnologias que nos permitem mostrar um rascunho “mais bonito”, perdemos muito da troca criativa que um simples desenho pode render.

Analógio e digital podem e devem se complementar no processo criativo. Em outras palavras, os jovens devem voltar, sim, ao papel, porque representar ideias no papel é importante. Nunca deixará de ser. Fica mais fácil dividir ideias junto aos envolvidos. Fica mais simples se fazer entender ao apresentar um projeto ou uma solução. Fica infinitamente mais fácil deixar a criatividade correr solta e atingir com sucesso o objetivo de atender as expectativas necessárias – o que, no final das contas, é o que mais importa.

Costumo dizer à minha equipe que eu prefiro mil vezes uma ideia “torta” no papel a um render que demora o dia inteiro para ser preparado. 

Chamo também de “pergunta ilustrada”, pois a folha em branco ninguém critica. Sempre que possível, escolho infinitamente a agilidade da troca de ideias pelos croquis para, depois – e aí sim com total assertividade -, fazer uma entrega bem ilustrada. O desenho precisa voltar a ser encarado como ferramenta para externar as ideias, não só como um breve apoio. 

Mesmo tendo todos os softwares que possibilitam desenhos virtuais, desenhar no papel, com lápis, desenhar muitas vezes externa melhor a ideia do que virtualmente. 

Desenhar é, pura e simplesmente, começar a materializar os desejos, os desígnios de um briefing. E o que é materializado assim se transforma, da melhor forma possível, naquilo que o cliente realmente quer.

Para aqueles que têm medo do papel em branco, ou vergonha de desenhar, recomendo deixar o medo de lado e começar a praticar o quanto antes. Desenhar é, também, uma forma de se conectar à essência daquilo que se cria. E, quando a gente está intimamente envolvido com o que cria, tem certeza absoluta daquilo que entrega. É onde seu repertório pode fazer a diferença.