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Educação é direito à inclusão?

Reforço que a escola não daria conta de educar sobre tantos temas que envolvem valores, crenças, entre outras camadas do ser humano.

*Por Samanta Lopes 

Quero que você imagine um grupo de mulheres saindo de um núcleo de cultura, entre tantos outros espaços do gênero na cidade, e entrando em uma estação do metrô para usar o toalete, antes de se deslocarem para suas casas. Elas foram realizar uma atividade educativa e cultural, afinal, educação é direito à inclusão, certo? Infelizmente, não para todas as pessoas.  

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A falta de letramento, ou seja, a falta de uma educação plural, que dialoga com grupos diversos, escuta e vê as pessoas, que é mais ampla e humanizada, se trata de um gargalo que pode causar danos irreparáveis. 

Em um post do Instagram, o coletivo @mafiadasminas, denunciou a violência que o grupo de mulheres sofreu na estação de metrô Sapopemba, na Zona Leste, no dia 10 de abril de 2022 (domingo). 

Ao verem o grupo, as mulheres da equipe de limpeza chamaram a segurança, denunciando que “um homem” tinha entrado no banheiro feminino. Rapidamente, o oficial de serviço abordou o tal “homem”. 

Sei que não estava presente, mas a gravação do ocorrido fala por si – o link está no final desse artigo. No entanto, enquanto educadora, preciso destacar alguns pontos desse episódio que poderia ter seguido por outro caminho. 

O poder de um dispositivo à mão pode ter evitado ainda mais violência, porque estão nítidos no vídeo as falas e a atitude agressiva do agente na estação, que só se afasta quando percebe que está sendo gravado, puxado por outro agente. No Brasil, só podemos denunciar esse tipo de coação com provas e testemunhas, algo que nas empresas é parte de um enorme processo quando se trata de denunciar um assédio de qualquer ordem. Temos de captar evidências e elas precisam ser coerentes. 

Enquanto há o confronto, o agente anda de um lado para o outro, nervoso e contrariado, sem demonstrar arrependimento. Agressivo, dá literalmente um tapa na pessoa que está filmando. 

Na estação, ele é uma figura que deveria trazer segurança e tranquilidade às pessoas que usam o espaço, no entanto, nessa hora, age como um agressor e promove medo e sensação de incapacidade no grupo ali presente, que não tem o que fazer frente à “figura de autoridade” que representa. Inclusive, ele faz ameaças, dizendo: “Eu vou tirar o uniforme e o papo será outro”, se impondo ao grupo fisicamente. 

Apesar de ter percebido que se tratava de uma mulher no banheiro de mulheres, ele não abre mão da postura agressiva. Quantas pessoas da comunidade LGBTQIA+ adoecem, desenvolvendo doenças renais crônicas por ficarem horas sem usar os toaletes em empresas e lugares públicos, para não passarem por esse tipo de violência? 

Nesse momento histórico, em que várias empresas discutem a importância de banheiros agêneros, banheiros individuais ou coletivos, mas com algumas adaptações para tornar esse momento tão íntimo das pessoas mais seguro e tranquilo, vemos indivíduos que lidam com uma diversidade imensa de usuários todos os dias assumindo uma ação preconceituosa e excludente.  

Há o caso da Starbucks da Filadélfia/EUA, em 2018, quando dois homens negros foram impedidos de usar o banheiro e convidados a sair, mesmo explicando que estavam esperando outra pessoa e que consumiriam depois que ela chegasse. Foram retirados pela polícia, que foi chamada pelo gerente do local. Apesar de não oferecerem resistência, essa ação gerou ação popular, e o fechamento de toda a rede para treinamentos sobre atendimento a clientes e o preconceito. 

Reforço que a escola não daria conta de educar sobre tantos temas que envolvem valores, crenças, entre outras camadas do ser humano. Por isso a formação familiar, cultural, pessoal, entre outras, precisam ser cuidadas, e é fundamental formar uma pessoa cidadã que estará apta a conviver com quaisquer pessoas, que seja mais flexível e aberta, sem “apego” a preconceitos. 

Os pais ou responsáveis devem estar atentos e participar da formação dos valores sociais, éticos e morais do indivíduo. O que não isenta cada um de suas escolhas e das responsabilidades que tem de assumir após exercer esse direito. Aqui, faltou o exercício do respeito, um ponto inerente ao cargo do agente, que deveria agir dentro das normas com qualquer pessoa, sem nenhum viés de gênero ou qualquer outro. 

As empresas atuam com e para pessoas, esses exemplos são parte da realidade que vivemos há muitos anos e que não cabe mais. Nenhuma pessoa deve ter seu direito de ir e vir desrespeitado ou sua vida ameaçada. As formações em letramento étnico-racial, LGBTQIA+, entre outras, são fundamentais para promover revisão de vieses, crenças, valores, promover a desconstrução e construção de novos padrões mentais, comportamentais e atitudinais.  

Cabe a cada um escolher quais atitudes vai adotar. É um processo de aprendizagem constante, inclusive para lidar com as consequências de suas escolhas. É algo que precisamos trazer nas discussões de descrição de cargos, construção de carreiras e de cidadania na sociedade. Devemos considerar, até mesmo, as devidas penalizações que envolvem ser parte da manutenção dessas violências e opressões. 

Sendo assim, o único lugar que não cabe mais é o de omissão. Estar em uma posição de privilégio, poder, e usar para ferir é criar um grande risco para a empresa, para si e para todas as pessoas com as quais você interage pela toxicidade e violência que poderá promover.  

O mundo é um terreno fértil para grandes mudanças, precisamos dar um passo de cada vez. Você, protagonize a mudança que deseja viver! Pesquise, aprenda, humanize-se e faça diferente!