Por Marina Pechlivanis.
“Gifting abarca afeto, carinho, economia, eficiência. Já em um futuro próximo será parte integrante do planejamento estratégico de diversas marcas, empresas, serviços.”
Roberto Duailibi
As dádivas ou presentes fazem parte da nossa história e envolvem as nossas tradições há muito tempo, desde que as primeiras socialidades foram estabelecidas, seja como mito, seja como fato.
À luz da mercadologia contemporânea, mais que estudar os gifts em si, o Gifting dá consistência ao contexto em que estas trocas são efetivadas, potencializando-as. Trata-se do clima, da ambientação; um espaço físico e sensorial de contato e convivência oferecido por uma marca, produto ou serviço com o intuito de proporcionar uma forma distinta de comunicação, envolvendo a inserção de objetos de desejo e de afeto, tridimensionais ou não, no universo particular de cada consumidor.
Para além das cercas delimitadoras de um campo do conhecimento, o gifting promove a troca nas fronteiras do relacionamento — entre pessoas, comunidades, culturas e tribos, unidas por vínculos de consumo e distintas por suas tradições, rituais, questões de ética e de etiqueta, interesses, objetivos, estratégias, necessidades, negócios.
Segundo Elza Tsumori, o gifting “é uma alma que dialoga; uma coisa viva que se molda a cada necessidade e pergunta que fazemos na hora de planejar e criar. E isso não vejo em outras ferramentas de Marketing. Talvez porque o pensar gifting faz parte da natureza humana há milênios.”
Alguém tem dúvidas? Eis um exemplo clássico.
Conta a Ilíada que certo dia Páris, o rei de Tróia, cobiçou e raptou a belíssima Helena, esposa do rei de Esparta, provocando com isso a ira dos gregos. Estes, então, armaram-se e velejaram em direção ao reino de Páris a fim de trazer Helena de volta. Com isso, teve início a famosa Guerra de Tróia.
O cerco à Tróia estendeu-se por dez anos repletos de violentos combates. Apesar de seu enorme empenho, os gregos não estavam conseguindo romper os muros da cidade. Diante disso, decidiram pôr em prática uma ideia de Ulisses. Construíram um gigantesco cavalo oco de madeira que trazia escondido em seu ventre soldados gregos e o abandonaram a poucos metros das portas de Tróia.
Depois, esconderam-se, fingindo uma retirada. Julgando que os seus adversários tinham desistido e acreditando ser o cavalo presente dos deuses, os troianos o introduziam na cidade. Na madrugada do mesmo dia, enquanto os troianos dormiam, os gregos saíram de dentro do cavalo e abriram as portas da cidade para o resto do exército. Com esse engenho ardiloso os gregos conseguiram vencer a guerra.
Citado na Odisséia de Homero e também na Eneida, de Virgílio, deste mito surgiu a expressão “beware of Greeks bearing gifts” (evite gregos trazendo presentes) ou, na versão mais clássica, “I fear Greeks even when they bear gifts” (temo os gregos mesmo quando trazem presentes).
Vejam que interessante: o gifting está sempre associado a modas, modismos, tendências, de acordo com cada grupo social onde é reconhecido, desejado, trocado, adquirido, experimentado, vivenciado, consumido. As ações de gifting fazem sentido quando podem ser interpretadas e associadas a experiências desejáveis, de acordo com cada cultura e com sua bagagem para entender o design, o desígnio de cada ação. Para Adrian Forty, “o design tem a capacidade demoldar os mitos numa forma sólida, tangível e duradoura, de tal modo que parecem ser a própria realidade”.
Marcos Rodrigues de Lara reforça que “o valor e o significado não se localizam no objeto em si, e sim na linguagem que o circunda, de maneira que o encanto não está no objeto consumido, porém nos olhos de quem o consome” pois “cada objeto envia uma mensagem e representa um espaço determinado das relações sociais.”
Oh! Se desejamos aquilo que a mídia nos informa ser o objeto de desejo, o cavalo de Tróia atual poderia ser, entre outros gadgets, um tablet.
Quem não fica seduzido por tanta tecnologia em um formato tão compacto? Depois que você abre as portas de sua fortaleza, deixando esta dádiva dos deuses contemporâneos entrar em sua vida, pronto. Prepare-se para investir seu tempo e seu dinheiro em novos aplicativos e games, em top tens, em novos lançamentos, upgrades, novas versões…
No Superstudio Più, Tortona, durante a Design Week de Milão de 2012, fiquei surpresa com o case da Samsung “Life/installed, quattro minuti per pensare il futuro”, uma instalação de Italo Rota. Uma perfeita integração de plataformas, um gift para todos os que visitaram o espaço, aparentemente sem cor e sem conteúdo mas repleto de possibilidades à luz do equipamento:
?
O efeito sedução Cavalo-de-Tróia vale para tudo. Ficamos encantados, nos deixamos levar. E esta é a hora de sua marca entrar, de forma inteligente, construtiva, procurando surpreender positivamente aqueles que se propuseram a dialogar.
Pode ser uma frase inspiradora no script da central de atendimento ao consumidor, pode ser uma certa forma de atender os clientes no ponto-de-venda, pode ser uma gentileza corporativa associada a uma causa social. Se a estratégia por boa, mesmo com um investimento pequeno o impacto pode ser muito grande. É preciso planejar, integrar marketing, advertising, branding, networking entre tantos outros “ings” ao gifting.
Como categoria, com todas as suas subcategorias.
E com uma vocação milenar para os negócios, pois a regra do gifting é esta: não importa se é real ou virtual, o que importa é o ritual das trocas. Pois, de acordo com códigos e contextos de cada tribo, é ganhando que se recebe, e é recebendo que se retribui, e é nas trocas que se conquista.
Assim caminha a economia, a política, a tecnologia, a humanidade.
Finalizo com a dica: entre Tróias e tablets, está o efeito maçã da Branca de Neve.
Muito cuidado com o que sua marca oferece. Especialmente quando o seu cliente confia em você.