A rotina da atendente Dayane Soares foi quebrada nos últimos dias. Quando voltava para casa, no dia 08/05, deparou-se com uma mulher aparentemente louca, com vestido manchado de café, falando sozinha na Estação do Move, em Venda Nova, Belo Horizonte.
Como em meio a um surto, a mulher entrou no ônibus e sumiu. No outro dia, quando Dayane chegou para trabalhar na Estação São Gabriel, lá estava ela de novo. “Você sabe o que está acontecendo aqui? Ontem vi essa mulher perto da minha casa. Eu não estou entendendo nada”, disse.
Bastou esperar um pouco e logo Dayane já estava tomada por “Café?”, montagem da Cia Efêmera (SP), que faz parte da programação do FIT-BH. Neste caso, não é apropriado falar que a peça está em cartaz, já que o objetivo é atravessar a rotina dos trabalhadores com um pouco mais de poesia.
Foto: Divulgação/Cia Efêmera.
“Café?” é uma intervenção da atriz Tatiana Lenna, mineira de Belo Horizonte, há sete anos radicada na Capital paulista. “O público do festival não chega. É para quem está circulando no local”, explica o assistente de direção João Bienemann.
Ao longo dos 40 minutos de duração, a atriz dispara reflexões sobre o ir e vir e a forma como as pessoas têm lidado com as próprias vidas. “A gente recebe, a gente trabalha e continua andando, andando, andando”, diz, enquanto trabalhadores apressados passam sem se dar o trabalho de ouvir.
“É um trabalho sobre o efêmero”, afirma a atriz. O que importa para Tatiana é que cada transeunte leve um fragmento do diferente que atravessou sua rotina. O espetáculo foi criado há três anos, mas é a primeira vez que participa de um evento do porte do FIT.
Foi apresentado em estações do metrô de São Paulo, em favelas e becos. A preocupação sempre foi chegar a locais aonde o teatro raramente vai.
Improviso
Por mais que Café? tenha uma dramaturgia, assinada por Manuela Ramalho, o inesperado sempre faz parte das apresentações. No dia em que foi apresentado na Estação do Move, no Bairro São Gabriel, a personagem pediu e ganhou um pacote de biju de um dos vendedores ambulantes que se preparava para embarcar.
Teve também o encontro emocionado com uma espectadora que se mostrou mais aberta à intervenção. Sem poder ficar para ver até o final, foi se despedindo da atriz e explicando a razão do abandono. “Vou cuidar do meu filho”, disse. A intérprete deixou-se dominar pela solidão e emocionou algumas pessoas na pequena plateia.
“Ela consegue incorporar a personagem. Teve gente que achou que era doida. É muito legal”, comentou a estudante Brenda Santos. “Chamou a minha atenção. Fiquei confusa, mas depois que vi o fotógrafo me aproximei. Parece que são muitos personagens”, surpreendeu-se Camila.
“Nunca estou sozinha, mas com todo mundo. Fico muito emocionada em compartilhar esse trabalho com Minas Gerais”, conclui a atriz Tatiana Lenna.
O FIT acontece até 25/05, em Belo Horizonte. Programação completa e endereços podem ser encontrados aqui.