Agências

Quais são as barreiras para a evolução do ESG no Live Marketing?

O Promoview conversou com agências, empresas e profissionais do setor para descobrir o que pensam sobre esse assunto.


Nos dias atuais, é bastante comum que grandes empresas, em seus processos de contratação, levem em conta aspectos como orientação sexual, etnia, nome social e pronome. 

As marcas e empresas estão cada vez mais se preocupando com a diversidade e inclusão social em seu quadro de colaboradores, em resposta a uma maior conscientização da sociedade sobre o assunto ESG, sigla em inglês para Ambiental, Social e Governança (Environmental, Social and Governance).

De acordo com uma pesquisa da Federação das Indústrias do Estado do Paraná (Fiep), 87% dos brasileiros têm preferência por se relacionar com empresas que tenham práticas sustentáveis no momento de realizar as suas compras ou investimentos, ao mesmo tempo que 70% dessas pessoas afirmam não ligar em pagar mais por isso.

Foto:-Depositphotos

Com isso, várias marcas passaram a investir pesado em ações de ESG, e era natural que esse movimento, mais cedo ou mais tarde, se estendesse para as agências de live marketing, afinal, de nada adiantaria uma empresa com um discurso de apoio ao ESG que não tem as mesmas práticas em suas relações comerciais com as agências.

No ano passado, uma importante associação do segmento de live marketing lançou uma campanha de conscientização que pedia um maior respeito e empatia às empresas contratantes de serviços de Live Marketing.

A campanha fez uma analogia da palavra ESG (governança ambiental, social e corporativa) que está tão presente no discurso, mas é pouco aplicada na prática.

Durante a pandemia de Covid-19, o setor de Live Marketing, que faturou aproximadamente R$ 50 bilhões anuais no Brasil até 2019, passou por uma fase bastante delicada, com dois anos de paralisação, eventos presenciais cancelados, fechamento de agências e crescimento da quantidade de cortes e demissões.

Agora, após o fim da pandemia, com a retomada do setor em 2022 e a recuperação e o grande boom em 2023, parece que toda essa movimentação em torno do ESG esfriou na área do Live Marketing

A relação entre anunciantes e parceiros continua praticamente inalterada, com muitos discursos bonitos e poucas mudanças em temas sensíveis para o setor, como o modo como são realizadas as concorrências, os pagamentos, as solicitações de exclusividade e os feedbacks.

Com base em todas essas informações e questionamentos, o Promoview foi atrás de agências e profissionais do setor, para saber o que pensam sobre o tema.

Batux

De acordo com Chris Bradley, CEO da Batux, todos os principais clientes da agência têm preocupação com políticas e práticas ESG, mas, segundo ela, ainda exploram pouco esse universo para fora, pois ainda trabalham um pouco mais internamente. 

Chris Bradley, CEO da Batux. Foto: Divulgação

A Batux tem esse cuidado e essa política. Estamos fazendo com que todas as promoções e os projetos que realizamos, a partir deste ano, tenham, por exemplo, compensação carbono. Já fazemos isso em nossos processos internos, mas, passaremos a colocar isso como uma prática para todas as ações que formatemos. Temos bom relacionamento com todas as marcas que atendemos e entendemos que essas práticas serão bem aceitas e adotadas pelas marcas”, ressalta ela.

Internamente, temos relações sustentáveis com nossa equipe, mantendo uma relação saudável com nosso time. Hoje, trabalhamos no formato híbrido, respeitamos os horários e as particularidades de cada colaborador e/ou parceiro. Treinamos nossos gestores para termos uma gestão humanizada. Criamos este ano um Comitê Interno de Relações Sustentáveis e os colaboradores que fazem parte deste núcleo estão lá por vontade própria, voluntariamente, o que é muito bacana”, relata.

Já em relação ao esfriamento do assunto, Bradley aponta que o dia a dia das agências e dos próprios anunciantes acabou atrapalhando ou atrasando processos. Para ela, de fato, a correria e falta de tempo podem ter provocado essa sensação de atraso, mas 2023 será definitivamente o momento de “virar essa chave”.

Por fim, sobre as barreiras para a evolução do Live Marketing, ela afirma que não entende que existam tantos entraves assim. 

Essa correria e falta de tempo para essa retomada depois de dois anos atípicos podem ter passado essa sensação ou mesmo colocado novos conceitos em um ‘segundo plano’. Estamos todos em uma era de muitas mudanças na parte de Inteligência Artificial, tecnologia, inovação, conceitos etc. e todos estão muito preocupados com o futuro e se atualizando. Talvez algumas empresas não tenham essas políticas tão claras nos seus processos externos. Mas entendo que isso está mudando e não vejo barreiras para que as mudanças aconteçam de forma efetiva no live marketing. Acredito que cabe a cada empresa, a cada gestão, cuidar um pouquinho dessas práticas que fazem tão bem para construção de uma vida melhor no e do nosso planeta”, finaliza.

Guru

Na opinião de Rafael Almeida, COO da agência Guru, é possível perceber que o ESG não se trata apenas de um discurso, mas uma mudança efetiva na forma de enxergar o mercado, tanto de trabalho, como de consumo. 

Rafael Almeida, COO da Guru. Foto: Reprodução/LinkedIn

Ele relata que a maioria dos clientes da Guru se mostra atenta à evolução dessas relações, e compreende a relevância de abrir essa discussão de dentro para fora. 

A Ambev, por exemplo, nossa principal cliente, é comprometida desde sua cadeia de produção, com grandes metas ambientais, até projetos e investimentos que garantam diversidade e inclusão em seu time. Hoje, a importância desse entendimento em todas as pontas impacta positivamente a relação entre cliente e agência. Antes, era uma via de mão única, onde a agência recebia uma orientação engessada sobre os projetos, mas agora conquistamos uma maturidade onde podemos também apontar o que sentimos falta no planejamento e garantir uma mesma visão positiva de mundo”, revela.

Acreditamos que para termos pensamentos disruptivos, nossa equipe também precisa ser plural. É pensando sobre diversidade e inclusão desde a contratação que podemos construir não somente projetos de sucesso, mas também um ambiente onde cada indivíduo se sinta acolhido e possa expressar suas ideias e sua identidade sem receios. Assim como prezamos pela transparência nas relações, queremos que todos se sintam confortáveis para uma conversa aberta, pois é essa troca sem papas na língua que possibilita a transformação”, complementa ele.

Para ele, ao invés da grande retomada do mercado colocar o tema “embaixo do tapete”, ela é o resultado de um longo processo onde a adaptação se tornou cada vez mais necessária. Rafael pontua que os clientes se preocupam, sim, com o conjunto de práticas da agência, e não somente com os cases de sucesso. 

A Guru é focada em proporcionar experiências, inclusive para o próprio cliente, pois o ESG é a sobrevivência do próprio mercado a longo prazo. Um bom exemplo, na última edição da Oktoberfest de Blumenau, em 2022, além da questão dos resíduos durante a operação, também tivemos preocupação com o destino de todo o material produzido e como ele poderia ser reaproveitado; tivemos influenciadores de todo o Brasil mostrando uma visão plural de festa; e a gestão do evento quebrou recordes históricos de público e faturamento. É isso, no fim, que importa: construir uma experiência de ponta a ponta, passando pelos três pilares de social, ambiental e governança, desde o fornecimento, até o pós-evento”, diz.

Sobre o que impede a evolução do ESG no Live Marketing, o profissional acredita que boa parte do mercado ainda é resistente às práticas de ESG por não compreender seu propósito, uma vez que há uma relutância, muitas vezes baseada em uma cultura organizacional antiga, sobre não mexer em time que está ganhando. 

No entanto, ele alerta que o consumidor está cada vez mais exigente, ele se importa se o staff do evento tem uma infraestrutura adequada, se tem alguma meta de Lixo Zero, se existe diversidade no line up, etc. 

O trunfo é entender que o custo dessa adequação é muito pequeno comparado ao valor agregado que isso gera ao negócio, a amplitude no impacto da experiência, não apenas nas redes sociais, mas também no boca a boca. Enquanto utilizarmos réguas antigas, nunca conseguiremos mensurar novos resultados. Em um futuro próximo, a regulamentação dessas práticas no mercado e o estímulo de políticas públicas que estimulem a mudança também podem ser a grande virada de chave para o setor”, concluiu.

MAXI

Na opinião de José Augusto, Diretor Executivo da MAXI, a busca de adequação às iniciativas ESG está em alta não apenas no mercado de Live Marketing, mas na sociedade como um todo. 

Alguns de nossos fornecedores adotam há anos medidas que buscam mitigar o impacto ambiental de nossa indústria, ser o mais inclusivas possível e ter práticas de governança claras e sobretudo éticas. Em nosso país e em nosso mercado acredito que ainda temos bastante a evoluir nos três temas. Poderíamos dizer que os grandes clientes finais já tem regras bem definidas e não só as colocam em prática como também exigem de nós esforço nesse sentido”, afirmou ele.

José Augusto, Diretor Executivo da MAXI. Foto: Divulgação/Prêmio Live

De acordo com ele, a MAXI sempre teve a preocupação com os princípios ESG durante os processos de contratação e no relacionamento com os funcionários, sendo também conhecida pelos impactos positivos que procura, através de uma série de preocupações e ativações, causar na sociedade, mas não sem antes que isso aconteça dentro de casa, para com o próprio time. 

Ele não considera que a volta com tudo do mercado tenha feito o assunto ESG esfriar, pois a forte retomada do mercado parece ter acelerado muito o tema. “Talvez, essa seja uma das poucas heranças positivas de um período tão difícil como o que vivemos recentemente, com a pandemia”, declara.

Para José Augusto, a questão sobre as barreiras para a evolução do ESG no Live Marketing é a pergunta de ouro. “Imagino que cada player encontre barreiras diferentes, em suas jornadas, para colocar essas questões em prática. O que posso dizer é que cabe a nós todos que, de alguma forma, influenciamos o mercado, superar essas barreiras para fazer acontecer e comunicar de forma que sejamos referência para que todos sigam o mesmo caminho. Todos nós ganharemos com isso”, disse.

Outras agências/profissionais

O Grupo R1, principalmente por meio da TES Cenografia, é uma empresa que já pratica a sustentabilidade e o ESG desde 2015, antes mesmo da sigla ESG estar no discurso das empresas e do mercado. 

Marcelo Chanoft, Co-founder & Partner @ TES / Grupo R1. Foto: Reprodução/LinkedIn.

Marcelo Chanoft, Co-founder & Partner @ TES / Grupo R1, destaca que, para o Grupo R1, a retomada não prejudicou a evolução do ESG no segmento, pois isso é uma visão e foco da empresa desde 2015. Mas, para o mercado, ele pensa que sim e que ainda continua dessa forma. 

Menos com relação a diversidade (pois é o mais fácil de ver e o que faz mais vista e propaganda), mas em elevado nível para o descaso com o ambiental e com a governança. A falta de transparência e a pratica abusiva dos contratantes em relação aos fornecedores está em níveis nunca vistos”, reforça.

Ele acredita que os obstáculos para a evolução do ESG no Live Marketing são principalmente relacionados à falta da vontade de fazer. 

Essa é a barreira. Como disse acima, o maior dificultador é a falta de governança. Com praticas saudáveis, equilibradas e corretas nas relações, valorização, práticas comerciais e zero corrupção, são a base para a evolução do nosso mercado. Infelizmente a indústria de eventos no Brasil não está madura nesse quesito.  Muita coisa fica em baixo do tapete e todos fazem vista grossa”, encerra ele.

Wladimir Duarte é produtor de Eventos Corporativos, Culturais e de Live Marketing, com mais de 28 anos de carreira na área, além de apresentador do Podcast Foco em Produção, e vencedor do Prêmio Live 2022 na categoria Produtor Executivo.

Segundo ele, algumas marcas têm bem definida a questão do ESG em memorandos públicos, listados em seus sites, mas pouco se fala quando o assunto é colocar em prática de maneira efetiva, seja por uma questão de custos, seja por desinteresse, ou até mesmo desconhecimento. 

Wladimir Duarte. Foto: Divulgação/Prêmio Live

Para ele, a grande retomada do mercado acabou colocando debaixo do tapete esse assunto, ao menos em parte, pois a aceleração vertiginosa do 2º trimestre de 2022 em diante não deu a muitas empresas a chance de um planejamento mais extenso, mesmo que algumas empresas do setor tenham feito movimentos nesse sentido, conseguindo pautar o ESG no dia a dia da empresa/ funcionários e clientes. 

Assim como Marcelo Chanoft, Wladimir acredita que a grande barreira para a evolução e consolidação das práticas ESG no Live Marketing é a vontade. 

Porque verba e discurso muitas marcas tem de sobra, o que facilita e muito a consolidação do ESG no mercado de Live Marketing. Vale também mencionar que os profissionais das agências e dos clientes finais, além das empresas fornecedoras, precisam mergulhar no tema, incentivar seus profissionais a fazerem cursos sobre ESG, a fim de aplicar na prática esse conceito, que hoje é reconhecido como facilitador em contratações e até mesmo em investimento e crédito”, ressalta.