Por Marina Pechlivanis
Essa é a história que aconteceu com amigo meu, e que perfeitamente poderia ser sua ou minha. Tomei partido neste tempo de manifestações e usei nomes fictícios — a quem couber a carapuça, que preste bem atenção.
No papel de fornecedor, o Sr. A., da empresa Ah!, solicitou para o seu cliente Sr. O., da empresa Oh!, uma revisão de seus valores de remuneração considerando que algumas variáveis de vendas haviam deflacionado os recebimentos frente o volume de trabalho efetivado.
Depois de algumas reuniões e apresentações entre a equipe do Sr. A. e a equipe do Sr. O, novo processo, explicando todos os detalhes — o cenário macroeconômico, o motivo do reajuste, o aumento da demanda —, o Sr. A. recebeu o e-mail abaixo:
“Sr. A., bom dia. Estou escrevendo este e-mail para falarmos sobre o ajuste solicitado. Infelizmente, após várias análises e discussões internas, infelizmente não temos condições de reabsorver um reajuste no valor atual. Desde já me coloco à disposição. Obrigado!”.
Ipsis litteris. Sem tirar nem por nenhuma palavrinha, apenas corrigindo as palavras desacentuadas.
Vamos fazer uma análise do discurso do Sr. O., numa era em que o mercado preza pelos bons relacionamentos e por parcerias e negociações transparentes e sustentáveis.
Começa desejando um pseudo “bom dia” seguindo de dupla infelicidade, culminando em um “não” ocluso e uma disponibilidade “desde já” cujo prazo de validade expira no “obrigado”, considerando que ele já disse o que tinha que dizer e agradece a vã tentativa sem dar explicações para além de “várias análises e discussões internas”, evitando um novo contato. E, vale dizer, uma linha é desperdiçada com o inútil “Estou escrevendo este e-mail para falarmos sobre”.
O Sr. O., considerado eficiente, deu o recado de forma curta, pouco elaborada, redundante e vazia: “Infelizmente, infelizmente, passar bem!”. Poderia ser também “Infelizmente, infelizmente, dane-se!”. E, cá para nós, palavrinha infeliz esta “infelizmente”. Não justifica nada, a não ser a sua infelicidade. Negócios são definidos por estratégias ou por felicidades e infelicidades? Onde está a objetividade, as análises, os comparativos, as justificativas?
Bem… Poderia ser eu, poderia ser você.
No dia-a-dia de trabalho, na cadeia alimentar dos negócios, todo mundo pode estar na posição de cliente ou de fornecedor, atuando como Sr. A ou como Sr. O.
Para todos, aqui vai o recado: para negociar é preciso saber lidar com pessoas. Nunca ouvi dizer de alguém que tenha conversado com notas de dinheiro, talões de cheque, cartões de crédito ou fundos de investimento e estes tenham respondido com soluções.
As conversas são com pessoas. Logo, são a aplicação prática dos dons e dádivas de uma marca, para além das crenças, visões e missões impressas em belos cartazes enquadrados na recepção de seus escritórios.
E mais: tudo são elos. O dinheiro da empresa Oh! não é dela; é dos seus clientes. O dinheiro da empresa Ah!, também não: vai para outros fornecedores e parceiros também. E assim por diante. Todos os processos são interconectados em rede.
Ouviram falar de Gift Economy? Ainda é tempo: clique aqui.
Quanto ao e-mail do Sr. O., pena que não veio aos meus cuidados. Eu responderia com muito estilo, utilizando uma clássica e sábia parlenda infantil. Um texto bem intencionado, escrito na medida certa para que ele reflita sobre descaso e arrogância num tempo em que os mais badalados festivais de criatividade, comunicação e promoção valorizam campanhas que estimulem um mundo melhor para se viver, conviver, trabalhar.
Mais ou menos assim:
“Deixa estar, jacaré. Um dia a lagoa há de secar, os peixinhos hão de morrer e — felizmente, felizmente — você há de pagar!”
Por isso, dear all, ofereçam sempre o que tiverem de melhor, em todas as situações. Uma marca é tudo aquilo que ela oferece, inclusive nos e-mails de negociação.
Gifted inspirations para vocês, especialmente para o Sr. O.