Eventos de games

A gamescom latam ainda parece uma visita a um quarto gamer (o que é bom e ruim)

A mudança de endereço trouxe novos ares para uma das mais tradicionais feiras de jogos do continente, mas será que a entrega corresponde à expectativa?

São Paulo - Foi em julho do ano passado que a colunista do Promoview, Julia Padula, foi à gamescom latam, no SP Expo, em São Paulo. Naquela ocasião, ela comparou a feira a uma “visita a um quarto gamer”.

Pouco menos de um ano depois, a edição de 2025 já está correndo: a tradicional feira, uma das mais imponentes da América Latina, começou no dia 1º de maio (após um dia “VIP” para membros da imprensa e convidados da indústria). E a impressão original, bom, ela se mantém — se muito, parece que o tal “quarto gamer” passou por uma reforma, mas ainda não terminou de ser mobiliado. Entenda o motivo.

Nova casa amplia potencial da gamescom latam, mas edição de 2025 não faz justiça a isso

Imagem de uma estação de jogos durante a gamescom latam 2025
Oferta de jogos na gamescom latam 2025 é bem grande, mas algumas faltas notáveis ofuscam o brilho do conjunto completo (Imagem: gamescom latam/Divulgação)

Começando pelo “elefante branco”: a gamescom latam agora é realizada no Distrito Anhembi, zona norte de São Paulo. Por mais que a facilidade de locomoção ao local seja maior, esse é um ponto meio subjetivo: para quem sai da zona leste da cidade em direção ao SP Expo, como nas edições anteriores, essa mudança certamente é uma vantagem, mas o mesmo não pode ser dito de quem residia na zona sul, já que o local antigo, ainda que isolado, era relativamente próximo da estação Jabaquara do metrô.

Essa dualidade também foi percebida por membros da imprensa com quem conversamos informalmente: houve quem reclamasse, houve quem elogiasse. E considerando que o evento em si está em curso em meio a um feriado prolongado (e a as vias expressas perto do Anhembi, atoladas de carros querendo emendar uma viagem à praia), a “ida e volta” não foi nada ruim.

Internamente, é possível especular o motivo da mudança de casa: a gamescom latam parece maior. Consideravelmente maior. Para um gestor de eventos, isso é bom: de várias formas — não só um potencial para mais expositores e marcas participantes (o que, invariavelmente, gera mais faturamento), como os pequenos detalhes também ficam positivos: em 2025, quase não há cotoveladas e trombadas entre caminhantes por corredores apertados. Há folga de espaço e conforto.

Isso, no entanto, também traz um aspecto negativo: comparada ao ano passado, a gamescom latam 2025 parece…igual?

Tem jogos (mas não necessariamente os que você queria…)

Partes de diversos estandes da gamescom latam 2025
A Nintendo veio à gamescom latam com um estande suntuoso…mas sua maior atração do ano — o Nintendo Switch 2 — está ausente da feira (Imagem: gamescom latam/Divulgação)

O número de parceiros de conteúdo praticamente dobrou — 17 para 2024, em uma busca rápida no Google; 31 (que a gente tenha contado) para 2025, incluindo repetecos como Warner Games, Epic Games e Ubisoft, mas também novos entrantes, como Bethesda, Activision, Supercell, Valve e Arc System Works.

Mas a oferta desse conteúdo parece ter ficado abaixo do esperado: Activision promoveu um meet n’ greet e mini painel com o skatista brasileiro Bob Burnquist, para promover o jogo Tony Hawk’s Pro Skater 3 + 4…mas o jogo em si não veio. Nem uma versão demo.

O mesmo pode ser dito da Bethesda, que levantou um belíssimo e imponente estande, com identificação visual de vários de seus jogos mais recentes e até alguns não lançados, como Doom: Dark Ages — o problema: esta última parte não passou de um espaço lúdico para fotos. Considerando que o jogo já está pronto (ele sai no próximo dia 15), não montar estações de experimentação dele é, no mínimo, estranho para uma feira de jogos.

Mas talvez a falta mais sentida tenha vindo da Nintendo: a gigante japonesa — uma das três principais do setor, junto de Sony (PlayStation) e Microsoft (Xbox) — anunciou o Switch 2, sucessor de seu imensamente popular console híbrido entre tablet e aparelho de mesa — recentemente. As pré-vendas do aparelho já começaram, com entregas previstas para julho…e não havia uma estação para o aparelho, que não veio ao Brasil.

Mais ainda: a “Big N” não apenas “não trouxe”, como fez questão de anunciar que o Switch 2 não viria.

Não que suas concorrentes diretas tenham sido muito melhores: a Sony e a Microsoft limitaram-se a algumas estações de acesso público, disponibilizando jogos como o recém-lançado Assassin’s Creed Shadows (PlayStation 5) e umas cinco ou seis estações da linha ID@Xbox, a parte da empresa dedicada aos jogos independentes que mais se destacam em sua plataforma.

Junte a isso algumas ofertas que já se espera — Pokémon Go! rendendo competições, encontros e ações presenciais e virtuais, marcas de tecnologia vendendo produtos de informática, somadas a mini torneios de eSports e alguns sorteios de brindes (destaque para a Visa, que vai dar um Nintendo Switch — não o 2 — para quem participar das atividades em seu estande) e muitos, muitos creators a serviço da Twitch, e você já tem uns 90% da gamescom latam 2025 bem compreendidos.

a gamescom latam pode apostar no conteúdo para se destacar (mas há um risco)

Imagem de Shuhei Yoshida, uma das principais atrações da gamescom latam de 2025
Shuhei Yoshida, da Sony, atua nas relações de PlayStation com desenvolvedores independentes e foi uma das principais atrações da gamescom 2025 (Imagem: gamescom latam/Divulgação)

Os painéis apresentados são inúmeros, com vários temas e muitos destaques: este ano, o maior nome foi, de longe, Shuhei Yoshida, um dos executivos que iniciaram o Projeto PlayStation em 1993, ex-presidente da divisão global de jogos da Sony por décadas e que, hoje, encabeça as relações da japonesa com desenvolvedores e estúdios independentes.

Outro nome de peso foi Henk Rogers, co-fundador da Tetris Company, que apresentou um painel, participou de sessões de fotos e aproveitou a gamescom latam 2025 para lançar o seu livro The Perfect Game – Tetris: From Russia with Love. Para os não iniciados, foi Rogers quem levou o clássico jogo de organizar blocos e eliminar fileiras para o Ocidente. Sem ele, é provável que um dos maiores títulos da história do mercado tivesse ficado apenas na Rússia.

O conteúdo apresentado nos painéis servem como uma excelente forma de contextualizar o mercado atual dos videogames para quem vem de fora (algo importante, considerando que a presença de marcas não endêmicas implica a presença de executivos não endêmicos, o que por sua vez abre novas vias de investimento), além de estabelecer um laço mais aprofundado com o fã brasileiro — hoje, estamos na 10ª posição no mercado global, e somos o segundo em volume de engajamento, segundo o Statista.

Outras apresentações trataram até de temas mais específicos, como os papeis da comunicação e da imprensa no setor nacional, as características específicas que nos tornam um setor aquecido, porém diferente do que se vê nos EUA e Japão.

Isso tudo traz um enorme diferencial à gamescom latam, mas também inclui um risco: se tirarmos o conteúdo e avaliarmos as ofertas de estandes e empresas, hoje, a feira não se difere em nada de seu concorrente, a Brasil Game Show (curiosamente, também de mudança: ela sairá do Expo Center Norte para ser abrigada pelo mesmo Distrito Anhembi, neste ano).

Ambas têm estandes com jogos, espaço para desenvolvedores independentes, marcas de informática vendendo peças e organizando campeonatos variados.

Não que a BGS não tenha painéis, palestras e meet n’ greets. Mas uma forma fácil de entender é: enquanto a BGS tem mais a cara de “pai de família que leva o filho para uma feira de games e tecnologia”, a gamescom latam é mais destinada ao fã que tem uma compreensão maior de mercado.

Mas se ambas trazem ofertas majoritariamente similares, há aqui uma possível aposta: a gamescom latam pode se concentrar mais no conteúdo (e sacrificar a audiência massificada do público que só quer jogar videogame e comprar/ganhar brindes) ou investir na oferta de interações com o fã e potencialmente alienar o público mais, digamos, hardcore.

Hoje, os dois eventos são praticamente iguais: no exemplo atual, o estande mais lotado foi o da Twitch, que organizou encontros com seus criadores de conteúdo afiliados (a fila literalmente dava voltas pelo enorme quadrilátero centralizado no pavilhão do Anhembi). Mas isso também é uma visão bastante comum na feira concorrente, então qual a diferença prática?

A gamescom traz enorme potencial para crescer

Imagem da fila de entrada da gamescom latam 2025
Novo endereço da gamescom latam pode enganar olhos menos treinados: evento está maior, e a expectativa é de mais público que edições anteriores (Imagem: gamescom latam/Divulgação)

Todas as argumentações parecem dizer o contrário, então é importante deixar claro: a gamescom latam 2025 está muito boa. Para todos os efeitos, há ofertas de interação para qualquer um que se associe aos jogos, seja casualmente ou de forma mais aprofundada.

Mas para se manter firme e escapar do “mais do mesmo”, ela terá que trazer mais diferenciais.

Se seguirmos na analogia posicionada pela Julia, ano passado, é seguro dizer que a gamescom latam ganhou um quarto maior, mas a mobília, os pôsteres na parede, a TV e o computador ainda são os mesmos. Tem mais espaço para melhorar? Sim. Mas neste momento, não há nada que seja notável de fato.

Rafael Arbulu

Redator

Jornalista há (quase) 20 anos, passeando por editorias como entretenimento, tecnologia e negócios, sempre com um olhar crítico e praticamente nostálgico. Por toda a sua carreira, sempre buscou detalhar desde as tendências mais disruptivas do mercado até as curiosidades culturais que desafiam a lógica do "só porque é novo, é melhor". Fã de vinis, cervejas especiais e grandes sagas literárias, ele traz para os textos doses generosas de referências pop – mas sem esquecer que, no universo corporativo, até o lado B precisa fazer sentido.

Jornalista há (quase) 20 anos, passeando por editorias como entretenimento, tecnologia e negócios, sempre com um olhar crítico e praticamente nostálgico. Por toda a sua carreira, sempre buscou detalhar desde as tendências mais disruptivas do mercado até as curiosidades culturais que desafiam a lógica do "só porque é novo, é melhor". Fã de vinis, cervejas especiais e grandes sagas literárias, ele traz para os textos doses generosas de referências pop – mas sem esquecer que, no universo corporativo, até o lado B precisa fazer sentido.