Experiência de Marca

Marcas travam disputa silenciosa pelo patrocínio de uniformes na Copa do Mundo da FIFA

Assim como as equipes em campo, as marcas estão envolvidas em uma batalha secreta pela supremacia nos trajes dos jogadores.


Em 16 de julho de 1950, o Brasil enfrentava o Uruguai na final da Copa do Mundo no Maracanã, o maior estádio do mundo na época.  

Faltando onze minutos para o final, Alcides Ghiggia atordoou a multidão de 199.854 pessoas, o maior público já reunido para um jogo de futebol, que ficou em silêncio enquanto ele colocava o Uruguai na frente. 

O Brasil, de uniforme branco com listras em azul, que era anfitrião do Mundial, tentou desesperadamente mudar o curso da história. Mas os visitantes de azul claro conseguiram um dos maiores imprevistos da história esportiva. 

Foto:-Depositphotos

A partida ficou mais tarde conhecida como Maracanaço.

Os brasileiros ficaram tão desolados com a derrota que decidiram aposentar definitivamente o uniforme branco com listras azuis. A empresa de artigos esportivos Athleta ficou então encarregada de encontrar o novo traje perfeito para o Brasil.

Foi Aldyr Garcia Schlee, 19 anos, de Pelotas, no sul do Brasil, que inventou a combinação agora lendária da camisa amarela e verde com calções azuis e brancos. O fabricante brasileiro de artigos esportivos Athleta não só se tornou o fornecedor da camisa da Seleção Brasileira em 1954, mas também o primeiro fornecedor oficial de kits de uma seleção nacional de futebol. O Brasil ganhou a Copa do Mundo cinco vezes nestas cores e a camisa que nasceu do desespero cresceu e se tornou um farol de esperança.

Athleta e a inglesa Umbro produziram em conjunto as camisas brasileiras para as Copas do Mundo de 1958, 1962 e 1970.

Sete equipes diferentes ganharam a Copa do Mundo desde 1958. Até o torneio de 1974, os fabricantes não estavam autorizados a exibir seus logotipos nos uniformes. A camisa da Argentina de 1978 foi a primeira a ter o logotipo da Adidas, fabricante da camisa, exibido com destaque.

O patrocínio das camisas da seleção nacional é um grande negócio e a competição, naturalmente, é acirrada. 

A recompensa para um patrocinador de camisa é mais do que simplesmente exibir seu logotipo, que é apresentado sobre o peito direito da camisa, a perna esquerda dos shorts e as meias, além de qualquer outra roupa oficialmente licenciada da equipe. Isso também significa um pedaço do negócio de futebol de 6 bilhões de reais, bem como uma fatia maior do mercado global de mercadorias esportivas licenciadas, avaliado em 30 bilhões de dólares.

Na última final da Copa do Mundo, ambas as equipes, Croácia e França, foram equipadas pela Nike, com a França saindo vitoriosa. No acordo anterior, a Federação Francesa de Futebol recebeu 42,6 euros. Após a vitória na Copa do Mundo, pelo privilégio de ser o patrocinador da camisa da França, a Nike tem que desembolsar 50 milhões de euros por ano até 2026.

As ações da Adidas caíram 6% durante o mês da Copa do Mundo de 2018, quando a Alemanha, uma das favoritas da Adidas, foi eliminada mais cedo. Durante esse mesmo período, depois que a França ganhou o torneio, a Nike ganhou 4%. As vendas da Nike relacionadas ao futebol alcançaram mais de US$ 2 bilhões no ano fiscal de 2018.

Em 2014, foi exatamente o oposto. Foi uma final de Copa da Alemanha, tomada pela Adidas, quando a Alemanha levou para casa a Copa após derrotar a Argentina. A Adidas relatou vendas relacionadas ao futebol de 2,1 bilhões de euros naquele ano e de cerca de 98 milhões de camisas comercializadas, sendo 3 milhões da vitoriosa equipe alemã.

Em 2010, os campeões da Espanha usaram um kit Adidas. Em 2006, a Itália, futura campeã, teve a Puma como patrocinadora de seu kit.

A Copa do Mundo de 2002 viu pela primeira vez a equipe brasileira da Nike levar para casa o título da Copa do Mundo. Vestida com as três listras icônicas da Adidas, a França levantou o troféu em 1998. Em 1994 foi a Umbro, cujo logotipo figurava na camisa da Seleção Brasileira que foi campeã. Em 1990, a campeã Alemanha teve a Adidas como patrocinadora de seu kit.

Em 1986, quando o capitão argentino Diego Maradona beijou o troféu, ele tinha acabado de ganhar com o galo gaélico do Le Coq Sportif em seu peito. Em 1982, o Le Coq Sportif fez os kits para a Itália, mas seu logotipo não foi exibido. Em 1974, a Alemanha Ocidental foi equipada pela Erima, e venceu o torneio. Em 1966, a Umbro fabricou os kits para a Inglaterra. 

Gráfico: TBS News

A Adidas foi a primeira empresa a colocar sua marca na Copa do Mundo e, durante décadas, foi de longe a maior patrocinadora de kits das seleções nacionais. Na Copa do Mundo FIFA 1974 na Alemanha, a marca das três listras patrocinou 10 das 16 seleções nacionais. A Adidas usou isto como um trampolim para liderar o mercado por décadas. A Adidas também é fornecedora das bolas de jogo oficiais da Copa do Mundo.

No total, a Adidas foi a patrocinadora de 134 equipes desde a Copa do Mundo de 1974. A Nike está em segundo lugar com uma certa distância, com 63 times nacionais equipados. Isso é impressionante considerando que a Nike só entrou no jogo de fabricação de kits de futebol na Copa do Mundo de 1998. Atrás delas está Puma, com 50 seleções vestidas com seus uniformes.

Os kits feitos pela Umbro já foram uma característica regular da Copa do Mundo até 2014. Ao longo da história do torneio, a marca patrocinou 22 equipes, principalmente na Inglaterra e Escócia, em seu país de origem. Seu maior momento na Copa do Mundo veio na Copa do Mundo de 1966 quando, das 16 equipes que competiram, 15 usaram kits fabricados pela Umbro. A única exceção foi a URSS.

Infelizmente para a Umbro, naquela época, os logotipos dos patrocinadores dos kits não eram exibidos em camisetas.

As outras marcas que vestiram as equipes na Copa do Mundo são Lotto (9), Le Coq Sportif (7), Hummel (5), Joma (4), Reebok (4), Diadora (3), Kappa (4), Marathon (4), Topper (3), Uhlsport (3), Admiral (2), New Balance (3), Rapido (2), Aba Sport (1), Asics (1), Atletico (1), Brooks Sport (1), Burrda Sport (1), Erima (1), Errea (1), Legea (1), Levi’s (1), Mitre (1), Penalty (1), Raihna (1), Shamil (1), Sonitex (1), Weekend (1), Majid (1) e One All Sports (1).

Com tantos times que usaram kits feitos pela Adidas, a marca se tornou a que fabricou kits para o maior número de campeões mundiais, com 5. Umbro e Athleta têm cada um deles, quando se juntaram para vestir o time brasileiro em três de seus triunfos na Copa do Mundo, Erima tem um, Le Coq Sportif conta com dois e a recém-chegada Nike já patrocinou dois campeões.

O México foi a seleção com o maior número de marcas como seu patrocinador ao longo dos anos. A camisa da Copa do Mundo El Tri Colors foi fornecida por 6 marcas (Levi’s, Adidas, Umbro, Aba Sport, Atletica, e Nike).  A Bélgica está em segundo lugar com 5 marcas diferentes que se destacaram ao longo dos anos.

A marca dinamarquesa Hummel fez 5 participações na Copa do Mundo e todas ao patrocinar a Dinamarca. A marca foi a patrocinadora de seu time de casa de 1926 a 2004 e novamente de 2016 até atualmente.

Na batalha do kit da Copa do Mundo deste ano, a Nike lidera o grupo com 13 equipes que compõem cerca de 40% das seleções na disputa. A Adidas vem em segundo lugar com sete equipes, enquanto a Puma tem seis.

Seis marcas têm uma equipe – Hummel (Dinamarca), Majid (Irã), Marathon (Equador), NewBalance (Costa Rica), Le Coq Sportif (Camarões) e Kappa (Tunísia).

A Adidas disse que espera vendas de cerca de 400 milhões de euros (US$ 415 milhões) relacionadas à Copa do Mundo, o que representaria cerca de 2% da receita anual extra.

Alguém poderia se perguntar qual seleção de futebol ganha mais com seus negócios de kits.

Nesse caso, a Alemanha é duplamente vitoriosa. A Adidas é o fornecedor de camisetas da Alemanha há mais de 65 anos e em seu atual acordo, a federação alemã recebe 60 milhões de euros da Adidas por ano. O acordo está previsto para vigorar até 2026.

Os próximos dois na lista são os atuais campeões mundiais França, que ganham 50 milhões de euros por ano da Nike pelo patrocínio do kit. Já o acordo do kit da Inglaterra com a Nike vale 42 milhões de euros por ano.

Dos 3 grandes fabricantes de kits, a Adidas, em sua maioria, equipou times com um alto nível futebolístico. Seis das sete seleções que usam os kits da Adidas nesta Copa do Mundo estão classificadas entre as 20 melhores equipes do mundo, de acordo com o último ranking da Fifa.

Mas isso não significa que a Nike não tenha equipes de primeira linha, pois sete das seleções que ela veste estão entre as 20 primeiras. Porém a marca também equipa as seleções de classificação inferior, como o Catar e a Arábia Saudita, que estão ambas entre as equipes de classificação mais baixa que competem este ano.

A Nike, entretanto, tem uma carta na manga com o Brasil. A Seleção Brasileira venceu o maior número de títulos da Copa do Mundo e está entre as favoritas para repetir a história este ano.

Foto: Depositphotos

Já a Itália, que é a mais importante equipe com patrocínio da Puma, não conseguiu se classificar para a Copa do Mundo de 2022. Antes de a Nike assinar um acordo de patrocínio de 10 anos, então sem precedentes, de US$ 160 milhões com a equipe brasileira em 1996, ela tinha apenas US$ 40 milhões em vendas de futebol e era vista apenas como uma marca de tênis de corrida e basquete.

Até agora, durante a Copa do Mundo FIFA Catar 2022, que começou em 3 de dezembro, as ações da Nike subiram pelo menos 1%, já que o Brasil e a França se saíram bem. Enquanto isso, a Adidas caiu 3,8% devido ao fraco desempenho das equipes que patrocina, como a Alemanha.

Desse modo, assim como as equipes em campo, Nike, Adidas e Puma também estão envolvidos em uma disputa silenciosa, mas igualmente fascinante.