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Deixa que eu empurro

Foi emocionante ver aquelas cases pretas (para quem não conhece, são as caixas onde todos os equipamentos são carregados), perfeitamente alinhadas, com mensagens fortes e atitude.


Aconteceu ali, em volta de um dos mais conhecidos cartões postais da cidade de São Paulo: o Monumento às Bandeiras, do escultor Victor Brecheret, e bem ao lado do Parque do Ibirapuera. 

A obra, que é uma homenagem aos bandeirantes que exploraram os sertões nos Séculos XVII e XVIII foi estrategicamente escolhida, pois sintetizava o pano de fundo ideal, a cenografia mais do que perfeita e a locação corajosamente escolhida para a manifestação daqueles que são responsáveis por dar palco aos artistas, aos palestrantes, aos convidados, aos músicos, aos clientes e a todos aqueles eventos onde, normalmente não os vemos, mas que fazem tudo isso acontecer: a área técnica do eventos.

A imagem da passeata, onde todos vestiam as suas tradicionais roupas pretas, mostrava que aquela galera gente boa, pau pra toda obra, alegres, energizados e que se autointitulam a “Turma da Graxa”, tinha resolvido sair da invisibilidade que a sua profissão sempre exigiu. 

Afinal, você nunca vai para um show ou evento e deixa de olhar para a atração principal, e nem deve imaginar que para que aquilo aconteça dezenas, e, às vezes, centenas de pessoas estão envolvidas. 

Da apresentação do ticket na entrada, passando por toda a montagem da infraestrutura, luz, som, imagem, segurança, serviços, limpeza, banheiros e a preocupação principal de fazer com que a experiência do espectador seja completa, e que eles simplesmente não apareçam, o que ironicamente significa que tudo deu certo.

Foi emocionante ver aquelas cases pretas (para quem não conhece, são as caixas onde todos os equipamentos são carregados), perfeitamente alinhadas, com mensagens fortes e atitude. 

Uma procissão com um certo tom de cortejo, fúnebre talvez, por tudo o que vem acontecendo, mas extremamente forte, energética e cheio de esperanças da parte de quem nunca deixou a peteca cair.

Esta galera está pressionada pelas decisões de corte radical dos eventos e pelo desaparecimento por completo das tarefas que eles fazem e da profissão que possuem. 

Ninguém aqui está questionando os cuidados necessários para conter, prevenir e se proteger da pandemia, mas sim, o quanto estão olhando para eles, para seus problemas, para suas famílias, e, mesmo com iniciativas incríveis de vaquinhas, movimentos e campanhas, eles precisavam ser vistos, ouvidos e foi isso que fizeram no domingo (02/08).

Se fôssemos fazer uma analogia do mercado de eventos com o mar – e sim, ele está realmente sujeito a um tempo horroroso, cheio de tempestades e más condições de navegação, com fortes recomendações de que ninguém saia para o mar aberto – poderíamos também dizer que as empresas de eventos são os navios e boa parte delas está procurando buscar soluções para impedir que elas afundem.

Umas trocaram o navio por outro menor, outras deixaram ele ancorado esperando a tormenta passar, outros ainda mandaram um caiaque para cada funcionário dizendo que agora cada um também navega, tem ainda aqueles que estão buscando outras rotas, outros portos ou destinos, há os que abandonaram o navio e agora controlam tudo de seus botes, muitas criaram navios virtuais para atender uma demanda de quem queria estar navegando não importa como fosse, os botes salva-vidas estão prioritariamente destinados aos passageiros pagantes, mas felizmente, tem muitos que fizeram de tudo para preservar sua equipe, mas infelizmente que ainda não sabem quando vão zarpar.

Mas em todo esse “cenário marítimo dos eventos”, existe uma grande questão: Há os que cuidam dos navios, muita gente olhando o tempo, gente esperta mantendo o custo dos portos, passageiros sempre procurando a melhor oferta, mas muito poucos se preocupando claramente com os marujos e a tripulação. 

O que fazer com eles? Como dar o que fazer? Como mantê-los? Não dá pra confrontar a necessidade de cuidar do navio com a da marujada, não podemos ser críticos e nem fugir das prioridades, mas quem fala ou se movimenta por eles? Qual momento alguém buscou colocá-los como uma prioridade? Afinal, são Seres humanos, possuem família, são contribuintes, giram a roda econômica e inclusive também são eleitores.

Pois quando a gente fala da turma da graxa, a gente não fala só de quem trabalha no navio, a gente fala de quem o constrói, de quem carrega nas mãos e nas costas tudo o que precisa ser embarcado e desembarcado, são os estivadores, os operadores de gruas e guindastes, são aqueles que estão por trás de tudo isso e nunca deixam o motor do navio parar. 

Se precisar são rebocadores, se precisar mergulhar para desenroscar a âncora é com eles também, e mesmo não tendo a roupa incrivelmente branca do capitão e sua equipe, nem falar várias línguas como os tripulantes e com o paladar moldado demais por pizzas na madrugada para poderem ser uma referência culinária dos restaurantes do navio, eles são imprescindíveis para a carta náutica ter função e o navio chegar onde tem que ir, principalmente trazendo para seus convidados/passageiros uma grande experiência.

Se pudermos resumir de maneira poética, eles são a luz no palco, o som vindo do microfone, a afinação dos instrumentos, a imagem do telão, o conforto do local, o respeito pelo público pagante, a experiência do evento e a lembrança mais incrível de quem assistiu. 

Com um detalhe: Com a generosidade e o senso profissional sem deixar a quem é devido o respectivo palco, luz, imagem e som, pois eles sabem que estão a serviço de algo e o fazem da forma mais perfeita.

Pouco se falou deles, mesmo com os sinais claros. Mas claro que se a gente resolver o que fazer com o navio, eles embarcam juntos, mas e se o navio não zarpar?! Se trocarem por trem, ônibus, caminhão, micro-ônibus, van, moto ou bike? O que fazer com essa galera? E o mar, tem jeito? Dá pra encarar?

Ao tomarem um sol quente na testa numa manhã de domingo, vestindo seus trajes pretos e pedindo “deixa eu que empurro meu case”, eles estavam empurrando também seu orgulho, seu profissionalismo, sua vontade de fazer parte e gritando de maneira ordeira, pacífica e ‘sussa’, do jeito “gente boa que sempre são”, que eles têm a necessidade de serem vistos, considerados e colocados – ainda que momentaneamente – sob a luz principal do palco, microfonados, com retorno, TP, ponto e prontos para mostrar seus verdadeiro talento: Fazer e ajudar as estrelas a brilharem.

Se o mundo precisa de novos caminhos, assim como também era na época dos Bandeirantes há séculos, foi emocionante assistir essa manifestação ao lado justamente do símbolo da importância, coragem, fibra, energia e tenacidade destes incríveis profissionais, que de uma forma inédita se uniram, clamaram e estão aguardando esperançosos um “valendo”.

Como bandeirantes modernos, eles estão prontos para empurrar, puxar, levantar, içar, carregar e fazer as coisas acontecerem. Então, meteorologistas, passageiros, agências de turismo, capitães dos navios, tripulantes, destinos, senhores dos 7 mares, gestores dos portos e dos píer, todos aqueles que legislam, mandam, controlam ou têm isso por função, por favor olhem para nossos queridos graxas, pois é como se todos estivessem falando: comande aí e fale pra onde vamos, já o resto… “Deixa que a gente empurra”.