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Basta de ver e não enxergar

Não sei se contribuo, mas pelo menos encaminho publicamente algumas das minhas inquietudes.

Neste momento importante quero dividir aqui minha contrariedade com o tal discurso da polarização da política nacional entre dois extremos.

Essa conversinha temos ouvido nos debates superficiais na grande mídia, nas redes sociais e em diversas outras manifestações de pensamento preguiçoso e desatento.

Sob qualquer ótica honesta tecnicamente há apenas um extremo, à direita, representado pelo governo mais inepto da história brasileira, cujo único projeto parece ser destruir o que resta do país.

O Brasil passou vergonha global na gestão da pandemia, na condução da política econômica, nos debates da ONU, onde lidera um grupo de países ultraconservadores que votou contra os direitos reprodutivos de mulheres e meninas, na má-fé com que desmonta as estruturas de proteção do meio ambiente, na insana política de estímulo às armas de fogo.

Pode-se-gostar ou não da corrente que se contrapõe com mais força e potencial eleitoral ao grupo do atual presidente, hoje representada pelo PT e mais especificamente pela figura polêmica do ex presidente Lula, agora de novo elegível.

São verdades incontestáveis que ao longo dos dois mandatos de Lula o Brasil era interlocutor respeitável no concerto das nações, crescemos economicamente como não acontecia desde a época do “milagre” dos anos 70; tínhamos uma gestão de meio ambiente de alto nível; trinta e dois milhões de brasileiros deixaram a pobreza rumo a classe C; o número de matriculados em universidades multiplicou-se.

Economia crescendo, live marketing crescia junto. Tínhamos um mercado muito mais próspero e condições para desenvolver nossas empresas, abrir vagas de trabalho, pagar impostos.

Creio que todos se lembram com saudade.

Ao mesmo tempo respeitava-se contratos, havia liberdade de expressão sem contestação nem perseguição a veículos e jornalistas.

Academicamente falando foram governos, na “pior” das hipóteses, de centro-esquerda. Longe, muito longe, de representar um extremo.

Cinquenta e oito milhões de irmãs e irmãos brasileiros desatinaram nas eleições de 2018, divididos entre ignorantes, obtusos, alienados e abjetos (se você apertou o maldito 17 na urna escolha uma das quatro categorias. Com ou sem autocrítica seu lugar é uma delas). 

Viramos o pior lugar do mundo porque aqui não houve governo nos últimos quatro anos. Não houve coordenação central inteligente na pior crise sanitária que vivemos, não há exemplo vindo de cima, não há empatia por parte do poder executivo, coragem do legislativo e consistência por parte do judiciário.

Por conta disso, todos nós estamos sofrendo, passando vergonha internacional e regredindo em termos civilizatórios e econômicos.

Destamparam a panela do inferno, um termo bem ao gosto dos neopentecostais mercantilizados que acharam espaço de poder ao lado da banda podre do agronegócio, da bancada da bala, da milícia carioca, dos terraplanistas e outros malucos de hospício.

Perderam a vergonha de desfilar preconceitos, exaltar torturadores, reescrever a história recente amenizando a crueldade e estupidez do regime ditatorial cujo aniversário de fundação o governo federal ganhou na justiça o direito de celebrar.

No meio de tudo isso lá se foram mais de 600 mil brasileiros. O candidato a tiranete, inexplicavelmente eleito, aperta os parafusos, e, alucinado, sonha com um golpe para o qual não tem apoio, força e inteligência suficientes.

Não é o caso de planejarmos uma volta ao passado. Espero sinceramente.

Apenas precisamos ser justos e evitar medir pela mesma régua elementos tão desiguais.

Isso pode, inclusive, nos capacitar a pensar em outras alternativas de construção de candidaturas que possam nos livrar a todos dessa maldição obscurantista que se abateu sobre nós.

É o momento de realmente enxergar, em vez de apenas ver.

De raciocinar com grandeza e sem preconceito.

Pararmos de apostar no ódio que nos levou a esse desastre atual.

Deixemos a negatividade para os negacionistas tacanhos, para os falsos evangélicos focados no dinheiro dos fiéis, os desumanizados de todos os matizes, e vamos investir nos esforços para, um novo penso na construção dos melhores caminhos para reverter os males impostos ao Brasil ao longo dos últimos anos.

 

Imagem: Malte Mueller/Getty Images.