Experiência de Marca

Palha de aço na cabeça

Agora, que o produto saiu do âmbito doméstico e foi parar nas passarelas da moda gerando uma lustrosa polêmica e promovendo causas, conceitos e pré-conceitos, isso vale a pena conferir.

Por Marina Pechlivanis

Que Bombril é mil e uma utilidades, todo mundo já sabia.

Agora, que o produto saiu do âmbito doméstico e foi parar nas passarelas da moda gerando uma lustrosa polêmica e promovendo causas, conceitos e pré-conceitos, isso vale a pena conferir.

Tudo começou com o desfile Verão 2014 do estilista Ronaldo Fraga, na SPFW, homenageando o futebol de várzea e a cultura negra.

O convite vinha com figurinhas de jogadores “de antigamente”, e o prospecto do desfile era grande pôster contando a origem do esporte. Na passarela, um campo de futebol estilizado, com marcações e trave de gol.

A trilha, ao vivo, destacava o acordeão entre outros instrumentos em uma bela orquestração de um repertório pertinente como “que bonito é…”. No figurino, criações inspiradas em uniformes antigos e em demais elementos deste universo, traduzidos em estampas, tecidos e acessórios — de listras das camisas e cadarços de chuteiras até as redes do gol.

E na cabeça, um elemento cênico interessante. Da passarela da SPFW não se percebia com exatidão — parecia uma espécie de peruca acinzentada padronizando todos os penteados, produzidos pelo cabeleireiro Marcos Costa. Nada que merecesse um destaque isolado dentro de um conjunto harmônico muito bem planejado: Veja aqui.

Mas, de outro ângulo, nas redes sociais, o tal penteado ganhou um vulto inimaginável, movendo brios e gerando discussões acaloradas associadas a racismo.

“Pra você que achou que pintar modelo branca de negra era o auge do racismo olha aí outra ‘homenagem’”, disse o rapper Emicida em seu Twitter. E logo depois a conversa ganhou um tom mais pesado, com menções na linha “Ronaldo Fraga Racista”, especialmente pelos fãs do rapper. Confira.

Dias depois, Ronaldo repetiu o desfile no CEU Butantã, e, frente à polêmica, precisou explicitar suas intenções com as tais perucas: “Esta será a primeira vez em que explicarei o desfile antes de ele acontecer.” Veja aqui.

Assim, contou que a palha de aço foi fundamental (literalmente falando), para a imagem do futebol.

“O sinal fraco das transmissões fazia com que só graças ao Bombril espetado nas antenas de TV a gente pudesse assistir às partidas.”

Quem já fez este ritual não tem dúvidas de sua veracidade — e funcionalidade.

E completou com o papel do futebol na primeira mestiçagem brasileira: antes, era apenas praticado pela elite, com uniformes de seda e linho. Depois, negros e mestiços trouxeram ao esporte inglês a sua ginga e os seus dribles, o conceito de futebol-arte com a agilidade e o ritmo da capoeira. Era uma reinterpretação conceitual, uma alegoria cultural para falar da história do Brasil e do futebol em linguagem de moda.

Em entrevista à Revista Maire Claire (20/03/13), Ronaldo destaca que seu desfile foi “Capturado pelo politicamente correto”. E completa: “Estou assustado com a repercussão porque eu sou mestiço, neto de descendente de escravos e filho de pai mulato jogador de futebol”.

Alguns se sentiram confortáveis com a resposta, outros, como algumas associações, nem tanto.

Falando em promoção de pessoas e de produtos, complexa esta nossa era das redes sociais. As informações circulam em velocidade astronômica causando tsunamis conceituais poderosos, porém muitas vezes sem checagem, sem profundidade, sem questionamento.

Há também uma complicada inversão de valores: o posicionamento de uma celebridade vale mais que o de um especialista, seja lá o que for dito. Afinal, se somos todos mediadores e fonte de informação, em quem confiar?

Aproveito a deixa para falar de planejamento integrado de comunicação. Pauta e tanto esta, apimentada, que poderia ser divertidamente aproveitada em ações promocionais, de live marketing, campanhas, gifting… Cadê? Ficou só no mundo da moda?

Bem, nada como os gifts que as circunstâncias nos dão.

Vou lustrar minhas ideias e aproveitar a nova moda.

Gifting na cabeça, que temos muito a fazer!