Experiência de Marca

O delírio da dengue

Com essa metáfora nada acolhedora estou de volta. E os mosquitos que me aguardem, porque eles podem me picar mas eu vou gritar. Mais, se por um lado eu sei que matá-los não resolve, por outro, posso aprender a picar, perturbar e sugar também.

Eu e meus títulos esdrúxulos, né? Mas fazer o que se eu vejo pertinência neles.

Depois de longa e tenebrosa ausência devido a um maldito mosquito transmissor da Dengue que me deixou entre a cama, duas tentativas frustradas de voltar a trabalhar antes do tempo, uma febre doida que ia e voltava, falta de apetite, fraqueza e angústia, sem nada a fazer, em alguns dias de cama compulsória, fui surpreendido com um sonho esquisito no qual, pasmem, o mosquito apareceu como se fosse um… cliente.

Claro que só posso atribuir à febre esse sonho tétrico.

Nele, o mosquito/cliente, desconhecido mesmo, nem sei quem era, vinha a mim e com um briefing numa pata e um tremendo ferrão na outra me impunha a total falta de escolha.

Seguinte, disse ele com voz de mosquito, você me dá seu sangue, fica prostrado aí. Me dá seu esforço, suas forças, suas reservas, faz o que eu mandar e… um tempo depois (no sonho, uns 60 dias ou mais) eu prometo te devolver o seu sangue, mas sem juros, digo sem nenhum acréscimo de plaquetas ou glóbulos vermelhos.

Aí, eu fraquinho, olhava pro mosquito e via um monte de outros mosquitos ao fundo fazendo a mesma coisa com outros amigos, sem poder fazer nada pra me defender. Matar o mosquito não dava né, afinal, ele faz parte da natureza e do equilíbrio ecológico do mercado, mas o que fazer, então meu Deus?

Impotente, com a dengue da fraqueza, no meu sonho, o mosquito ficava cada vez mais gordinho e eu e os amigos cada vez mais fraquinhos, impotentes, sugados mesmo. Pensei em tentar um papo com o mosquito, tipo: mas se você me sugar assim, e o resto do pessoal também, vai chegar o dia que não vai ter mais o que sugar.

De tanto dar o nosso sangue não vamos ter mais sangue nem reservas pra dar mais. Aí, o que vai sobrar? Vai ter que sugar sangue artificial de uns robôs que serão forjados para fingir que dão sangue pra vocês, mas que, na verdade, nem sabem o que é sangue. Eles vão fazer de suas refeições eventos sem nenhuma graça ou criatividade em troca de sangue falso… Você quer isso?

Mas aí pensei: Pô, o mosquito sabe disso, claro que sabe. Então porque continua a sugar desse jeito? Se nesse jogo, com o tempo, todo mundo vai perder?

Foi com esse pensamento que acordei. Assustado, ainda com o vírus da dengue a me corroer. Fraco, triste, cansado, a espera de um fumacê que nunca aparece.

Pensei em voltar correndo pro trabalho. Afinal, a gente precisa  trabalhar. Até me preparei pra isso quando me dei conta que esse danado do mosquito podia estar por lá, escondido, voando, fazendo zum zum, irritando a gente. E eu ainda tô bem fraco.

É isso. Impotentes, sem a intervenção das autoridades que bem podiam pôr fim a essa epidemia, mas parecem não querer, contando com a omissão do povo que não se pronuncia e deixa a água parada com medo que o mosquito se chateie, voltei pra cama para esperar ficar bom e torcer pro dia em que poderei conviver com mosquitos menos agressivos que suguem, ok, faz parte, mas que entendam que para o nosso equilíbrio é preciso que os dos sobrevivam: o mosquito e o doador de sangue.

Com essa metáfora nada acolhedora estou de volta. E os mosquitos que me aguardem, porque eles podem me picar mas eu vou gritar. Mais, se por um lado eu sei que matá-los não resolve, por outro, posso aprender a picar, perturbar e sugar também.

Eh eh eh … Zum, zum, zum zum.