Experiência de Marca

E tá confirmado. Ninguém lê!

Estamos forjando uma geração que não encontra nas palavras, na comunicação, o caminho de sua libertação e cidadania.

A Comunicação nos dias de hoje, para atingir de forma efetiva seus objetivos, tem buscado formas cada vez mais concisas de linguagem. E é bom que se faça, desde já, uma diferença clara entre Língua e Linguagem. A primeira é fato social que procura normatizar a Linguagem, a segunda, é reflexo da capacidade humana de se comunicar por meio de signos quaisquer que sejam. E é, sem dúvida alguma, essa capacidade que nos diferencia dos irracionais: a multiplicidade de possibilidades de Comunicação.

Mas aí, nessa análise, cabe uma terceira palavra que vai justificar o título do nosso papo: hermenêutica. Que, antes que você pare de ler, explico. É, num sentido amplo, a interpretação dos textos e, num sentido mais específico (filosoficamente falando), a busca do sentido e da verdade das coisas pela interpretação que delas fazemos.

Pois então, estava sentado no Cervantes, um bar conhecido de Copacabana, no Rio de Janeiro, com alguns amigos “Promocitários”, falando de letras de músicas e de lindos textos, como das canções do Chico e as poesias do Drummond, quando ouvi, na mesa do lado, da conversa entre dois estudantes de Comunicação (sei pelo material que traziam e pelo papo falando da Faculdade em que estudavam) a seguinte pérola:

– Cara, esse restaurante é muito show.

– Num é?

– Só tem um lance muito doido aqui.

– Qual é?

– O cara que fez não sabe nada de história e não sabe se comunicar direito.

– Ah é, por quê?

– Olha bem. O nome do restaurante é Cervantes, mas só tem quadro do Dom Quixote, pode?

E caíram na gargalhada da burrice do “cara”.

Minha vontade foi dar uma de professor de Literatura e Comunicação e dizer o óbvio, de forma didática… mas me aquietei quando pensei que estamos no País em que ninguém lê (sei que é exagero, mas é pra ser enfático e dramático) nada. E aqui não se trata de uma crítica conceitual, mas de um alerta aos estudantes de COMUNICAÇÃO.

Nas escolas de Ensino Médio, ninguém lê porque há, pasmem, professores que não leem, decoram textos e mostram os livros como se isso construísse conhecimento. Nas Universidades, ninguém lê porque os trabalhos são cópias da internet, onde o resumo já está pronto, e os professores parecem ter desistido de buscar nos seminários, discussões informais, filmes, jornais, livros, teatralização, idas a supermercados, exposições, etc., uma forma alternativa de implementar conhecimento.

Já, no Planalto, no MEC em especial, ninguém lê, porque pra ler seria preciso ter, no mínimo, vontade, formação e qualificação para estarem onde estão, pelo menos no que diz respeito aos currículos de cursos como os de Línguas e Comunicação.

Enfim, fiquei eu com o Dom Quixote na cabeça e o Cervantes no estômago e com a certeza de que estamos forjando uma geração que não encontra nas palavras, na Comunicação, o caminho de sua libertação e cidadania. Que não conhece Cervantes, De Simoni, Toscani, Shakespeare, Pessoa, Drummond, Shimp, Bandeira, Machado de Assis ou mesmo Paulo Coelho, vá lá.

A geração que espera os filmes para falar dos livros como se a visão de um único leitor pudesse transformar em imagens a emoção de um texto, com suas múltiplas interpretações e viagens. Que não conhece as funções da linguagem e, portanto, não percebe que ela, a linguagem, é que é o instrumento que pode nos permitir entender de forma profissional as mídias digitais, a publicidade, o marketing promocional e mesmo as emoções humanas, em última análise, o que cria e gera a linguagem, pois é na manifestação da alegria, da satisfação, da dor, da tristeza… da emoção que se consolidada o espaço para se chegar às pessoas.

Se você leu o texto até aqui, ótimo. Se não, é mais um que vai ficar olhando pro Cervantes e não vendo o Dom Quixote, que, aliás…, você leu? Se não, tudo bem, ninguém lê mesmo, né. E tudo é uma questão de hermenêutica. Ou não…?

Ai! Nesse momento, tô me sentindo o Cervantes…