Live Marketing

Podemos. Devemos?

Wilson Ferreira observa os eventos durante a pandemia de covid-19. Seguro?

Escrevo na noite de quarta-feira, dia 19 de maio. 

Acabo de sair, feliz, de um evento híbrido que entregamos a um de nossos clientes. 

Eventos híbridos, para quem tem dúvida, são aqueles que têm público presente (ainda que em menor número do que antes da pandemia por conta do distanciamento necessário), e, ao mesmo tempo, é transmitido via web para audiência remota. 

Eventos para audiências exclusivamente remotas são “virtuais”, não são “híbridos”, mesmo quando os palestrantes, apresentadores, etc., estão presentes no estúdio. O que determina a diferença é a audiência presencial ou não. 

Creio que nossa agência foi uma das primeiras a promover eventos corporativos híbridos na pandemia (em novembro de 2020, quando houve um breve período de “fase amarela” em São Paulo, e, agora, desde que as regras voltaram a permitir). 

Somos obcecados com os cuidados sanitários. Medição de temperatura, testagem de staff, distanciamento, álcool gel, higienização de microfones, catering adaptado, máscaras obviamente. 

Costumo dizer já há mais de um ano que para mim os eventos passaram a ter dois finais. Um quando terminam de fato e a entrega é realizada, e outro quatorze dias depois, quando falo pessoalmente com os líderes dos fornecedores para me certificar  que ninguém contraiu Covid-19. 

Até agora (toc, toc, toc) passamos batidos, sem nenhum caso, e, oxalá, assim permaneçamos, porque não se deve brincar com esse vírus, nem abrir mão dos cuidados necessários. Isso pode custar vidas. Eventual má prática não é apenas mau exemplo, é estupidez. 

Por tudo isso, quem me conhece sabe que sou ao mesmo tempo defensor de todas as medidas sanitárias responsáveis para evitar a disseminação do vírus e adepto (praticante de fato) da realização de eventos corporativos virtuais e híbridos. 

Eventos com público são possíveis e seguros (respeitadas as condições já descritas acima). 

Não à toa, o Governo de São Paulo anunciou a liberação de eventos-teste já em junho. Outros governos estão adotando medidas parecidas. 

Não há uma gota de negacionismo imbecil nisso. É, sim, um movimento racional e baseado em rígidos cuidados sanitários. 

Dito isso quero partilhar uma visão que pode parecer contraditória (e até pode ser mesmo, assumo). 

Ao mesmo tempo em que cá estou a fazer eventos com público e defendendo isso também em público, há certos eventos cuja realização não me deixa à vontade. 

Um que está me incomodando muito são os Jogos Olímpicos de Tóquio, previstos já para o mês de julho. 

Adoro esporte, e acompanho todos os Jogos Olímpicos desde 1976. Lembro vivamente de assistir às performances geniais de Nadia Comaneci, ginasta romena que encantou o mundo, e conversar com meu pai sobre a grande festa mundial que são os Jogos. 

Pois é justamente aí que a coisa pega. 

Para mim mais da metade do sabor das Olimpíadas tem a ver com esse congraçamento. Torcedores do mundo inteiro, festa nas arquibancadas e no entorno das arenas. A vida pulsando diferente na cidade sede, que abraça os turistas. 

Por mais que seja “safe” fazer os Jogos em Tóquio, vai ter graça? 

Jogos sem torcida? Ou apenas com público local, japoneses tão respeitosos e elegantes que raramente fazem barulho? Recordes quebrados só com a TV por testemunha? 

Entendo a frustração dos atletas que perderam um ciclo olímpico definitivamente. É a questão das empresas patrocinadoras, que tem na Olimpíada um mecanismo fantástico de exposição de marca e produtos. 

O que pensar do fato de 80% dos japoneses serem contra a realização dos Jogos agora em julho (segundo pesquisa divulgada há dias pelo Asahi Shinbum, um dos maiores jornais japoneses)?

Você gostaria de ir a casa de alguém que não quer te receber? 

E o Sindicato dos Médicos japoneses, que também se manifestou contra (em março)?

Me parece que teremos uma Olimpíada meio “envergonhada”. 

Vale a pena? 

E há um outro aspecto: eventos gigantes como Olimpíadas, grandes jogos de futebol, festivais de música, são também grandes festas. Há um fator de celebração muito importante. 

E qual é o clima para celebrar quando batemos 3 milhões de mortos pela Covid-19 em todo o mundo, dos quais quase 500 mil entre nós brasileiros. 

Vivo de live marketing, e no live marketing os eventos são um dos pilares. 

Mas também procuro praticar a empatia e ser uma pessoa interessada em pessoas. 

E o que vejo é estarmos todos feridos, com um caminho pela frente até superarmos – na prática – o pior da pandemia e, na conversa interna de cada um de nós, restabelecermos a condição de celebrar coletivamente. Disso ainda nos sinto distantes. 
 

Wilson Ferreira Junior é jornalista, empresário e corredor de rua bissexto. 

 

Foto: Reprodução.