ESG

Pacto Global da ONU quer engajar empresas brasileiras em sete ambições ESG

Novas iniciativas foram lançadas nesta semana em evento em São Paulo, com presença de CEOs e lideranças de sustentabilidade no Brasil

Na noite de segunda-feira, dia 25, mais de duas centenas de empresários, muitos deles, fundadores e CEOs de grandes empresas, e especialistas no tema de sustentabilidade e impacto social se reuniram no luxuoso salão do recém-inaugurado Rosewood Hotels & Resorts, em São Paulo, para a apresentação da Rede Brasil do Pacto Global da Organização das Nações Unidas (ONU).

A massiva presença de lideranças corporativas não foi à toa: a entidade estava lançando sua “Ambição 2030”, uma série de sete programas de temas prioritários para a agenda ESG (sigla em inglês para se referir a questões ambientais, sociais e de governança corporativa).

O tema nunca esteve tão presente nas mesas de diretorias e conselhos das empresas no Brasil e no mundo. Em um momento que só se fala do aquecimento global, suas consequências e o papel de todos — incluindo empresas — para minimizar seus riscos, os presentes queriam se associar, de alguma forma, à temática. Alguns mais pela imagem, mas outros porque já enxergam os benefícios econômicos e sociais de avançar na agenda ESG.

OS EFEITOS DA MUDANÇA CLIMÁTICA PELO MUNDO

Ao todo, são sete “movimentos”, como são chamados os programas elencados como prioritários. Eles são relacionados a diversidade de gênero, salário justo, acesso à água potável e saneamento, promoção da igualdade racial, diminuição das emissões de gases poluentes, cuidado da saúde mental das pessoas e transparência nas informações.  

Nós elencamos esses sete porque, ao fazer o planejamento de 2019, analisamos a fundo a materialidade das empresas brasileiras. Diversas considerações foram levadas em conta na escolha das principais e chegamos aos sete movimentos ao selecionar não só aqueles que são temas importantes para o Brasil, mas aqueles que já tínhamos alguma atuação também e poderíamos impactar positivamente”, explica ao GLOBO Carlo Pereira, CEO da Rede Brasil do Pacto Global.  

Cada movimento tem metas e submetas que devem ser cumpridas por quem aderir em prazo estipulado. O movimento Elas Lideram 2030, por exemplo, cujo foco é ampliar a participação de mulheres em cargos de liderança, exige que as empresas tenham 30% de mulheres em cargos de alta liderança até 2025 e 50% delas nessas posições até 2030.

E a meta do próprio Pacto é promover 11 mil mulheres para cargos de alta liderança no período, ter mais de 1,5 mil empresas comprometidas, sendo pelo menos 150 lideranças de alto nível engajadas com esta ambição. Já são 29 empresas comprometidas neste programa.

Para as empresas interessadas em aderir ao movimento, há dois caminhos: o gratuito e um pago. O gratuito oferecerá às empresas 12 encontros, entre lives e workshops sobre a temática, além de plantões mensais de dúvidas e mentorias em grupo.

Quem quiser uma consultoria mais personalizada pode pagar por isso – o Pacto tem produtos que incluem sua participação em um comitê estratégico da organização para as questões de gênero (ou D&I) e outras ferramentas, como uma para análise de lacuna para os associados entenderem onde estão precisando melhorar.

Cada movimento tem suas especificidades, seja de formas de engajamento das empresas na temática, seja em metas e prazos, apesar de todos terem como base os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, os chamados ODSs, da ONU.

“Movimento + Água”

No caso do “Movimento + Água”, para dar outro exemplo, o Pacto quer impactar mais de 100 milhões de pessoas com universalização do saneamento e segurança hídrica no país. As empresas participantes têm como meta ter 90% o esgoto coletado e tratado e 99% de pessoas com acesso à água potável segura até 2033, além de 50% de reflorestamento das áreas críticas que auxiliam na produção natural de água até 2030. Neste, já se comprometeram 10 empresas.

— Já havia uma transição para a economia de stakeholder em curso. Com a pandemia, a Guerra na Ucrânia, essa transição foi muito acelerada. As empresas são pressionadas interna e externamente a promoverem impacto positivo. Os Movimentos são apoios para as empresas e para as suas lideranças nessa transição para que elas e eles promovam impacto positivo de fato — explica Pereira.

Empresas podem se comprometer com mais de um programa, mas, para aderir, é necessário que seja membro da organização aqui no Brasil. Este é o primeiro programa do tipo no mundo, entre todos os escritórios da entidade da ONU.  

O acompanhamento da evolução das empresas será constante e, uma vez por ano, a organização divulgará o relatório do Observatório 2030. Os indicadores são identificados por um grupo de especialistas do Conselho Consultivo, Rede Brasil do Pacto Global, consultoria Resultante, Universidade de São Paulo, consultoria Falconi, e outras organizações parceiras, como Ministério do Trabalho, ONU Mulheres e Carbon Disclosure Project (CDP).  A primeira edição, inclusive, está no forno para sair e a reportagem conseguiu alguns dados com exclusividade.

Das 82 empresas avaliadas, somente 15 reportaram os dados de colaboradoras negras no quadro funcional das empresas (BRF, Cemig, Cielo, Cosan, Dexco, Energias BR, Equatorial, Itaú Unibanco, JSL, Movida, Raia Drogasil, Raízen, Sul America, Vamos, Via).

— Fica claro que ainda há baixa representatividade em cargos de liderança. Isso demonstra a necessidade de iniciativas mais estruturadas de retenção de grupos minorizados nas empresas — comenta Caroline Hirano, analista ESG Resultante e quem é a responsável na consultoria pelo levantamento de dados do Observatório.

Com relação a composição das empresas em percentual de mulheres em cargos de conselho, diretoria executiva, diretoria, gerência e coordenação, o percentual é maior quando as empresas são signatárias dos WEPs (Women´s Empowerment Principles) — e menos da metade das empresas analisadas aderem a esse compromisso (44%).  

Saúde e educação, olhados juntos, são os setores com o maior número de mulheres no quadro funcional (71%), embora esta magnitude não é, nem de perto, a realidade quando observados os cargos de alta liderança (com 6,4% nos Conselhos e 13,3% em Diretoria Executiva).

— O setor que mais tem mulheres no quadro funcional é o de Saúde e Educação, mas quando os cargos vão subindo, a quantidade de mulheres vai diminuindo. Isso demonstra que o papel que é atribuído às mulheres na sociedade, de cuidado, mas não de liderança, também encontra reflexos nas empresas — comenta Caroline.

Além disso, ela cita que as companhias precisam ir além do gênero.

— Há poucos dados, por exemplo, referentes à diversidade racial — diz.

Em clima, o destaque é a baixa adesão e comprometimento das companhias, ainda, com programas como Science-Based Targets initiative (SBTi), que mobiliza as empresas a adotarem metas baseadas em ciência na redução de emissões de Gases de Efeito Estufa, ou ainda o Business Ambition e o Race to Zero, campanhas para mitigar os efeitos das mudanças climáticas com apoio corporativo. Embora o discurso de combate às mudanças climáticas esteja em voga no setor empresarial, são poucas as empresas analisadas que são signatárias dos acordos indicados.

Segundo o relatório, apenas duas companhias conseguiram pelo menos uma das metas de redução de emissões pela SBTi aprovadas (Klabin e EDP Brasil). “Na prática, isso significa que significa que apenas essas empresas, dentre as analisadas, adotaram metas certificadamente baseadas em estudos e pesquisas que têm base científica.

— O que encontramos no caso do Brasil são dados que, em geral, têm se estruturado para serem mensurados e divulgados ao longo dos anos. O aumento para emissões de Escopo 3, por exemplo, é reflexo desse processo —diz Caroline Hirano, da Resultante.
Ela explica que, no caso do escopo 3, que, segundo a metodologia de mensuração de emissões do GHG Protocol (Greenhouse Gas Control) é a que abrange as emissões de carbono de toda a cadeia de fornecimento, o processo é complexo e composto por até 17 categorias de análise, como emissões na cadeia de fornecedores, na locomoção de colaboradores, em investimentos etc:

— As empresas têm se esforçado para trazer essas informações, mas ainda há dificuldades.

A amostra analisada é composta por empresas listadas na B3, somadas àquelas que reportam nos padrões do GRI (Global Reporting Initiative) e pertencem ao Pacto Global.   

Conheça os 7 movimentos da Rede Brasil do Pacto Global

Movimento Elas Lideram 2030 

Este Movimento ambiciona ajudar as empresas a assumirem e atingirem metas concretas pela equidade de gênero: ter mais de 1.500 empresas comprometidas, promover 11.000 mulheres para cargos de alta liderança até 2030 e ter pelo menos 150 lideranças de alto nível engajadas com esta ambição.

Mais do que um posicionamento público, o Movimento +Água propõe uma jornada conjunta por maior controle, transparência e ações coletivas, defendendo a definição de metas como uma maneira poderosa de impulsionar as empresas com vantagem competitiva na transformação da sociedade para a universalização do saneamento e a segurança hídrica no país, avançando no ODS 6 (Água Potável e Saneamento).

Movimento Salário Digno 

O Movimento tem a ambição de garantir 100% de salário digno para funcionários(as), incluindo operações, contratados(as), e/ou terceirizados(as) e promover e engajar toda a cadeia de suprimentos para desenvolver metas de salário digno.

Promover e fornecer um salário digno como um aspecto essencial do trabalho decente é a garantia de que os(as) trabalhadores(as), suas famílias e comunidades possam viver com dignidade e ter um padrão de vida decente.

Movimento Raça é Prioridade 

Para avanço individual e coletivo, este Movimento trabalhará para atingir mais de 1.500 empresas comprometidas, para promover mais de 15.000 pessoas negras (negras, indígenas, quilombolas, ou pertencentes a outro grupo étnico socialmente vulnerável) em cargos de liderança até 2030, mais de 20.000 pessoas negras capacitadas em soft e hard skills; diminuição do gap de remuneração entre os grupos étnicos-raciais socialmente vulneráveis e brancos; e mais de 150 lideranças influenciadoras de alto nível engajadas com esta ambição.

Movimento Ambição Net Zero 

Pretendemos colaborar para a redução de 2 Giga toneladas de CO2e em emissões acumuladas. Ambicionamos trabalhar localmente com reduções de emissões de gases de efeito estufa para impactar positivamente a sociedade brasileira e o meio ambiente global.

Movimento Transparência 100% 

Nosso objetivo é desenvolver instituições eficazes, responsáveis e transparentes em todos os níveis, encorajando e capacitando as empresas para ir além das obrigações legais, fortalecendo mecanismos de transparência e integridade.

Movimento Mente em Foco 

A iniciativa convida empresas e organizações brasileiras a agir em benefício de seus colaboradores e da sociedade como um todo no combate ao estigma e ao preconceito social ao redor da saúde mental.

O Movimento é uma forma de trazer para o centro das decisões das empresas a pauta da saúde mental, estimular a discussão sobre o tema, estabelecer ações concretas e de suporte aos seus colaboradores e criar um ambiente de trabalho saudável.

O objetivo é que a saúde mental seja tratada não apenas como uma medida emergencial, mas sim como um tema perene e que faça parte da estratégia de negócio das companhias – um avanço no ODS 3 (Saúde e Bem-Estar).